Eurocopa indica linha de cinco atacantes e “volta ao passado” como tendências táticas
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa o estilo de jogo e a estratégia de algumas das principais seleções dessa UEFA Euro 2024
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa o estilo de jogo e a estratégia de algumas das principais seleções dessa UEFA Euro 2024
A edição de 2024 da Eurocopa não chega a ser empolgante como em outros anos. No entanto, ela sempre foi um termômetro das principais seleções do Velho Continente nesse ciclo até a próxima Copa do Mundo. Principalmente no que se refere à formação tática usada por cada treinador.
Nesse quesito, este que escreve identificou uma certa tendência em várias equipes. Além da influência clara de um jogo mais posicional, existe a quase unânime utilização da variação para uma espécie de 3-2-5 nos momentos de posse. Na prática, o que muda em cada seleção é o(s) jogador(es) escolhido(s) para formar o trio de zagueiros e o quinteto ofensivo e as dinâmicas utilizadas para se levar a bola até a área adversária.
Além disso, existe uma certa aura de volta ao passado (seja ele recente ou mais distante) em algumas equipes, algo como uma inspiração algum método que funcionou antes. Não é errado afirmar que a preferência pelo 3-2-5 faz parte desse “revival” dependendo do do ponto de vista.
Três zagueiros, dois volantes, cinco atacantes e algumas variações
Antes de mais nada, é interessante notar que a utilização de uma linha com cinco atacantes visa dois objetivos básicos. O primeiro é criar superioridade numérica no campo de ataque. E o segundo (e talvez mais importante) é a busca por espaços nas defesas adversárias (quase sempre organizadas numa linha de cinco defensores). O que varia é a forma como cada seleção se organiza com a bola e a dinâmica usada nos momentos de posse.
A Suíça, por exemplo, conseguiu levar vantagem sobre a Itália com pontas e atacantes interiores descendo até a intermediária para abrir espaços para as infiltrações de Embolo e Ruben Vargas às costas da defesa. Ou até mesmo de um dos volantes, como no caso de Freuler.
A Holanda vem fazendo uma boa campanha nessa Eurocopa usando vários elementos daquele que ficou conhecido como “jogo de posição”. Há a amplitude através dos pontas que buscam a linha de fundo e a diagonal (com Gakpo e Dumfries). Há a troca de posições (com Xavi Simons e Memphis Depay). E há a chegada dos volantes a todo momento. Não é por acaso que a equipe comandada por Ronald Koeman tem sido uma das sensações do torneio.
Mas fato é que a grande favorita ao título (quando olhamos desempenho dentro de campo) é a Espanha de Luis de la Fuente. A atual campeã da Liga das Nações da UEFA é uma das equipes que melhor executa o chamado “jogo de posição” e apresentando boas variações nos momentos de posse.
Mais do que isso. O meio-campo formado por Rodri (o melhor volante do mundo na opinião deste que escreve), Fabián Ruiz e Pedri é extremamente talentoso. E o entendimento entre os laterais Carvajal e Cucurella com os pontas Lamine Yamal e Nico Williams é muito grande. Tudo partindo de um 4-3-3 inicial, saindo para um 4-2-4 e terminando num 2-3-5 com muitas associações pelos lados, passes por dentro e contra-ataques fulminantes.
A Espanha já nos traz uma das primeiras exceções à regra geral do 3-2-5 nessa Eurocopa. Via de regra, cada treinador vem adaptando seus conceitos em cada seleção dentro do grupo que possui (pelo menos em tese), ponto que nos mostra que há espaço para ideias diferentes.
As exceções à regra do 3-2-5 e o resgate do que já deu certo
Nesse ponto, a Alemanha merece destaque. Não somente pela campanha e pela união da experiência de Toni Kroos e Gündogan com a juventude de Musiala, mas pela forma como a equipe de Julian Nagelsmann se comporta. Ao invés do 3-2-5 (com o recuo de Kroos para junto de Rüdiger e Schlotterbeck), o escrete germânico aposta numa espécie de 3-1-4-2 nos momentos de posse. E tudo passa pela movimentação dos pontas no chamado “meio-espaço”.
Musiala e Leroy Sané chegam mais por dentro e abrem o corredor para as chegadas de Kimmich e David Raum. Gündogam se aproxima de Havertz (o falso-nove de Nagelsmann) e forma um quadrado na frente da defesa adversária. Foi assim que a Alemanha superou a Dinamarca nas oitavas de final.
Mas a grande exceção à regra é a França. Didier Deschamps vem apostando numa formação bastante semelhante àquela que utilizou na conquista da Copa do Mundo de 2018 com Rabiot executando o papel que era de Mautidi pelo lado esquerdo, como uma espécie de “volante/meia”.
Tchouaméni recua para fazer a saída de bola e Kanté dá o suporte seja como mais uma opção de passe ou se juntando a Mbappé, Griezmann e Marcus Thuram. Isso não quer dizer que Didier Deschamps abriu mão da linha de cinco atacantes. Com os laterais Koundé e Theo Hernández subindo com frequência ao ataque, a França ganha superioridade numérica quando tem a bola e mais opções para Griezmann distribuir o jogo no campo de ataque.
Mesmo assim, ela difere da “média” nesse sentido, já que as subidas de Kanté deixam a equipe francesa com até seis atacantes. Mas é interessante notar como Didier Deschamps resgata uma formação que deu muito certo há seis anos para recuperar a consistência defensiva do time.
E quem leva vantagem nessas quartas de final de Eurocopa?
Difícil não enxergar no duelo entre Espanha e Alemanha uma espécie de “final antecipada” dessa Eurocopa 2024. Taticamente falando, são as duas seleções que mais chamaram a atenção deste que escreve. Ao mesmo tempo, a França recuperou a consistência de outros tempos e deve dar trabalho para Portugal, ainda muito dependente do grande talento dos seus jogadores. E a Inglaterra de Gareth Southgate é a grande decepção e a Holanda tem bola para ir longe.
O ponto aqui é mostrar que essa Eurocopa (assim como em todas as outras edições) é um grande laboratório tático. Pode ser que a seleção campeã de 2024 nem seja aquela que mostra o futebol mais vistoso, mas a que apresenta mais segurança e executa melhor as ideias de jogo que foram propostas.
Seja como for, a Eurocopa (assim como a Copa América, a Copa Africana de Nações e outros torneios continentais) são ótimas oportunidades para ver o que vem sendo feito no futebol de seleções no seu mais alto nível. Ainda que a intensidade e/ou a qualidade esteja abaixo do que vemos nos clubes, é sempre gratificante observar, analisar e projetar o que veremos num futuro próximo. Que venham as quartas de final!