Pedro Certezas deve ser o botafoguense mais famoso que temos no momento. No mínimo o mais “zoado” pelos rivais e seguidores — que somam para mais de um milhão só entre X (antigo Twitter) e Instagram —, no ano em que o Botafogo foi um dos grandes protagonistas do futebol brasileiro, mas não um dos vencedores.
Durante a histórica arrancada do time carioca no primeiro turno do Brasileirão 2023, foram os vídeos do Certezas — normalmente gravados direto das arquibancadas do estádio Nilton Santos ou instantes após o apito final, em sua casa — os que mais viralizaram.
Já no momento da derrocada igualmente histórica no segundo turno, foram os conteúdos dele os mais comentados, entre “kkks”, provocações e resgates irônicos de publicações antigas. A animação do peixe no aquário com o áudio do “volta, Mister” é especialmente hilário, em qualquer contexto.
E o que explica todo esse “carinho”com Pedro Certezas? Claro que cantar vitória antes da hora, como ele fez após algumas vitórias-chave do Botafogo, é uma motivação e tanto. Mas o engajamento vai muito além disso.
“Ele é um gênio na questão da linguagem”, define Wallace Borges, jornalista da TNT Sports e companheiro de bancada de Certezas no programa “De 0 a 10”. “Tudo o que ele faz tem muito engajamento e ele sabe lidar com isso”, completa.
Wallace identificou o que cada vez é mais claro: que além de um ilustre botafoguense, Pedro Certezas é um ótimo comunicador. Ele transita facilmente entre as diferentes linguagens da internet, entre o humor e a informação, entre o comentário e a torcida.
É só ver a diversidade de conteúdos que ele publica em suas redes e os diferentes trabalhos que realiza, em especial pela TNT Sports. Tem meme, “esquete”, desabafo, comentário do noticiário, e para além da temática do futebol. Até a “instituição jacaré” já foi objeto de seus conteúdos.
Chega até um pouco difícil defini-lo entre influenciador, comentarista, repórter. Ele mesmo se define como humorista, por exemplo — “Botafoguense-humorista”, melhor dizendo.
A linguagem de Pedro Certezas e o crescimento na TNT Sports
Qualquer semelhança, aliás, com Casimiro Miguel, o Cazé da “Cazé TV”, não é mera coincidência. Também capaz de entreter e engajar comentando basicamente sobre qualquer assunto, o streamer tocou, entre 2017 e 2022, e junto com o Certezas, o “De Sola”, canal de veia humorística do finado “Esporte Interativo”.
O canal e a dinâmica que a dupla nele estabeleceu foram o laboratório da tal linguagem “genial” que o Wallace fala. Uma linguagem tanto no sentido mais amplo, transmidiática, ágil, multiplataforma, que dialoga com a realidade atual de consumo de conteúdo na internet, mas também uma linguagem no sentido mais literal, um jeito de falar mais despojado, numa cadência única, combinando gírias e palavrões com trejeitos de mesa redonda futebolística, referências noventistas e um carioquismo irresistível.
A ascensão meteórica de Casimiro fala por si só do sucesso dessa linguagem. Mas não é o único resultado a se mostrar. Enquanto Cazé cresce a cada dia como praticamente uma marca midiática, Certezas passou a trabalhar em um canal quase que moldado em sua imagem. E linguagem.
Em março de 2023, a TNT Sports anunciou uma reformulação em sua grade. Aproveitando a ausência de um “dial próprio” na televisão a cabo (as transmissões da Champions League são feitas nos espaços da TNT e do Space), o canal anunciou uma nova programação transmidiática, apoiada muito na internet e no YouTube. E no centro de tudo, ainda que não oficialmente, Pedro Certezas.
O influenciador chegou a ganhar um programa próprio de entrevistas (“Só para ter Certezas”), uma live na Twitch oficial do canal, além de participações consolidadas em diversos programas, como o “De Placa”, o “Programa De Sola”, o “De 0 a 10”, e, mais recentemente, o “De Sola a 10”.
Este último, aliás, é uma sátira do penúltimo, e faz comparações absurdas nos mais pitorescos assuntos, das melhores comidas do mundo às piores invenções da humanidade. Dá até para visualizar o Certezas no programa, né?
Mesmo assim, por menos sério que seja o “De Sola a 10”, ele é levado bem a sério pela empresa em sua grade. Tanto que foi um dos produtos apresentados no stand da Warner Bros Discovery na CCXP 2023 – e onde o Torcedores.com conversou com Certezas e os demais integrantes da bancada do programa satírico.
“Todo mundo (do programa) tem essa veia mais engraçada e tal, mas pô, ele é o capitão dessa parada”, comenta o narrador Jorge Iggor, que tem a inglória tarefa de comandar o programa, explicando a dinâmica com o colega humorista. “É alguém para lembrar para quem está assistindo que aquilo é uma palhaçada”, completa.
“O que a gente tem que entender é como é que a mulher dele aguenta”, complementa o sarcástico Vitor Sérgio Rodrigues, revelando um pouco da convivência com o influenciador. “A gente fica com o Pedro Certezas um período do dia. Ela que convive com ele 24 horas e ele é isso”, acrescenta, aos risos, o comentarista.
Claro que os colegas de Certezas não veem só o lado, digamos, palhaço. “Às vezes a gente trata ele muito como um piadista, um engraçadão e tal, mas tem muito estudo, muito trabalho”, pontua Wallace Borges.
De fato, por mais natural que seja o humor de Pedro Certezas, há um preparo. E de muito tempo. O seu trabalho de conclusão do curso de Publicidade e Propaganda na PUC-RJ, por exemplo, foi sobre a união entre entretenimento e esporte na comunicação.
“Eu não acredito no futebol sem entretenimento”, admite o próprio. “Eu não acredito num consumo em que um é separado do outro. Eu entendo quem gosta de tática só e tal, mas acho que tem que ter um show bizz”, sentencia.
A visão é mais realista do que idealista, no caso. “Infelizmente a gente tem que viver numa sociedade que tem que vender as coisas e a gente precisa consumir. Então quando a gente faz o “De Sola a 10”, por exemplo, futebol é um pretexto”, finaliza, sem nenhuma palhaçada, quando perguntado sobre a sua linguagem e sobre a participação na CCXP.
O conformismo com o sistema econômico vigente pode ser mais recente para o comunicador de 29 anos, mas a visão sobre o futebol vem desde menino. Adolescente durante o auge da rivalidade entre os técnicos Pep Guardiola e José Mourinho, que levaram a um crescimento de debates mais táticos sobre futebol, Certezas sempre carregou com ele uma visão mais humanista do esporte. Ou menos lúdica, pelo menos.
“Eu lembro que quando eu era mais novo, eu já não gostava de ver o Bate-Bola (programa da ESPN, consagrado em uma bancada com os jornalistas Paulo Vinícius Coelho, Mauro Cezar Pereira e Lúcio de Castro), por exemplo. Porque lá falava muito de tática”, relembra.
“Eu nunca fui um cara de saber os meandros táticos do time. Eu queria saber era do entorno do futebol. Então eu ficava muito mais interessado no que aconteceu no treino. Tipo, teve um cara que invadiu o treino, aconteceu alguma coisa, eu acho muito mais maneiro do que, porra, “o volante que é mais defensivo”. Eu não quero saber disso”.
Certezas mostra muita clareza na hora de definir as influências de seu perfil de comunicação. Ainda assim, é no assunto com menor ciência, com menor racionalidade, por assim dizer, que é possível ver o maior peso não só em seu trabalho, mas em seu jeito de ser. Sim, estamos falando do Botafogo.
Pedro Certezas, o “botafoguense-humorista”
“Eu realmente acho que a profissão que eu tenho hoje foi um pouco moldada pelo Botafogo. Na minha escola, por exemplo, eu vivi o Tri-vice contra o Flamengo (no Campeonato Carioca, entre 2007 e 2009). Então vários amigos meus me zoavam e eu tinha que dar um jeito, ia pelo lado mais engraçado, eu ia pelo lado da galhofa”, explica.
De fato, crescer como um botafoguense nos anos 2000 não deve ter sido fácil. Ao mesmo tempo, a ausência de conquistas, de glórias em campo, quase que “força” o jovem torcedor a buscar sentido, diversão – entretenimento – em outros aspectos dentro do esporte.
Para o jovem Pedro, esse sentido parecia, e ainda parece, estar na “zoação”. Durante a entrevista, foram várias as menções, por iniciativa única do entrevistado, às zoações. E dá para entender. Além de ser uma forma de sociabilidade, os embates das provocações futebolísticas entre amigos podem ser uma maneira, ora, de fazer o seu time vencer mesmo nas derrotas.
“Era um bagulho que eu fazia e eu faço constantemente porque eu sou assim, o Pedro Barreto, que não é o personagem, ele é assim”, admite. “É uma característica do futebol, é você saber zoar e saber ser zoado. Eu sei fazer os dois”, garante. Não duvidamos.
O Botafogo proporcionou ao Certezas uma sagacidade ímpar e também uma rara visibilidade, especialmente num ano de tamanho protagonismo dentro do futebol brasileiro.Por quatro meses — abril e agosto, o primeiro turno do Brasileirão 2023 — ele e outros criadores de conteúdo botafoguenses viveram o auge do que um torcedor que trabalha com o seu time podem viver. Os quatro meses seguintes, no entanto, não foram tão prazerosos.
“Hoje, nesse momento atual, o Botafogo tá fazendo mal profissionalmente”, revela. “Se eu fizer uma publi (conteúdo publicitário) hoje em dia vai ter mais comentários sobre o Botafogo do que engajando com a publi, por exemplo. Então profissionalmente não é tão bom assim”, relata. Mais do que compromissos comerciais, a queda “catastrófica” do time de General Severiano expôs Certezas ao desafio de separar a vida pessoal da profissional. E ele derrapou.
“É uma coisa muito difícil de dosar né? Porque quando acontece um ano do jeito que aconteceu, de “desastres” e “catástrofes assim”, você segurar o lado torcedor é muito difícil. Mas tem que fazer”, ele elabora.
O momento mais representativo dessa dificuldade admitida por Certezas foi a repercussão de um desabafo após a derrota do Botafogo para o Grêmio por 4 a 3, de virada, logo em seguida de outra derrota, também de virada, para o Palmeiras — e também por 4 a 3.
Na ocasião, o influenciador chegou a comparar o técnico interino Lúcio Flávio com uma “herpes genital”, infecção sexualmente transmissível. “Cometi um erro. Eu xinguei o Lúcio Flávio de uma forma pesada. Falei que eu errei e tal, mas foi uma coisa num momento que eu estava com a cabeça extremamente quente e eu deixei meu lado torcedor falar muito mais alto que o lado profissional e eu sofri por isso”, ele explica.
“Eu errei, eu pedi desculpas e eu acho que eu tenho direito de errar também, né? Não que eu amo o Lúcio Flávio não, sabe, eu odeio ele, mas assim, eu acho que o jeito que eu falei foi errado”, completa.
O lado torcedor e a divisão trabalho e vida pessoal
Os desafios da intersecção entre torcedor e comunicador nem sempre são tão dramáticos. Mesmo assim, não quer dizer que Certezas não sofra com isso. “Eu não consigo ir ao jogo direito, tenho que ir disfarçado para jogo por causa do assédio, que é uma parada que meu lado torcedor sofre um pouco”, exemplifica.
Outro ponto é a eterna batalha para deixar trabalho e vida pessoal separados. Certezas admite, por exemplo, que sofre com um vício no celular, fruto da necessidade de estar sempre conectado para o trabalho.
Mesmo assim, o balanço profissional de Certezas é positivo. “Eu amo meu trabalho”, ele declara. “É uma coisa muito muito rara (amar o trabalho), então, assim, eu tô muito realizado”, pontua.
Parte da paixão, inclusive, parece estar justamente nessa intersecção do pessoal e do profissional. “Eu sempre falo isso, que o que eu faço trabalhando é muito parecido com o que eu faria numa mesa de bar, lazer. Então eu não sinto que eu trabalho pra caralho. Eu trabalho, teoricamente pra caralho, só que eu não sinto esse peso do trabalho”.
Esse ponto é bastante visível para quem acompanha o trabalho do botafoguense. O uso de palavrões, por exemplo, seja durante a entrevista, seja em suas participações nos programas e lives, é um dos que mais chama a atenção.
Pode ser também um dos motivos que compõe esse “personagem”, que ele mesmo admite, que alcança tanta gente. Mas talvez personagem e pessoa, no caso de Pedro, se confundam mais do que o comum. No fim, mais do que influenciador, mais do que comunicador, humorista, Pedro Certezas é um torcedor.