Missão de Tite no Flamengo vai muito além da conquista da vaga na próxima Libertadores; entenda
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa o contexto da chegada do ex-treinador da Seleção Brasileira ao clube de maior torcida do país
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa o contexto da chegada do ex-treinador da Seleção Brasileira ao clube de maior torcida do país
Dono da maior torcida do Brasil (e de uma das maiores do planeta), o Flamengo também é um conhecido moedor de treinadores. Os anos da gestão Bandeira de Mello e Rodolfo Landim estão aí para provar essa tese. Depois das experiências terríveis com Vítor Pereira e Jorge Sampaoli, a diretoria rubro-negra se movimentou e acertou com o melhor nome disponível (na visão deste que escreve) para assumir o Fla: Adenor Leonardo Bachi, o Tite. Logo na sua apresentação oficial, o antigo treinador da Seleção Brasileira colocou a classificação para a Copa Libertadores da América de 2024 como seu primeiro e mais importante objetivo. Mas sua missão no Flamengo vai muito além do campo e bola.
Quem acompanha o espaço aqui no TORCEDORES já sabe que este que escreve considera Tite o melhor técnico brasileiro da década passada e ainda um dos melhores dos anos 2020 por conta do legado que deixou e dos números com a Seleção Brasileira. Por outro lado, isso não exime o agora treinador do Flamengo dos erros cometidos nas Copas do Mundo da Rússia e do Catar, mas isso e papo pra outro momento. Além de lidar com a pressão do clube de maior torcida no país, Tite também tem a missão de recuperar a confiança de um elenco estrelado, mas altamente desgastado. Não se trata apenas de “motivar” o grupo, mas de fazer os jogadores entenderem que é possível voltar e se manter no topo.
Não se trata apenas do encaixe dos talentos. Jorge Jesus, Dorival Júnior e até Renato Gaúcho conseguiram fazer o Flamengo jogar um futebol vistoso e eficiente. Se trata de reencontrar o equilíbrio entre defesa e ataque e resgatar jogadores que já são colocados na lista de “dispensáveis” por jornalistas, youtubers e torcedores. Muito da missão de Tite nessa reta final de temporada passa pelo seu último ciclo na Seleção Brasileira. Sua equipe ficou conhecida pela solidez defensiva e pela eficiência nas ações ofensivas. Um 4-4-2 que virava um 4-2-4 dependendo do que o jogo pedia e que (novamente) encheu o torcedor brasileiro de esperança às vésperas da Copa do Mundo do Catar.
É interessante notar que a Seleção Brasileira conseguia mostrar um bom futebol mesmo em contextos menos favoráveis. O polêmico empate sem gols contra a Argentina em San Juan é um bom exemplo. Atmosfera hostil, arbitragem conivente com os lances mais ríspidos da Albiceleste, Messi em campo e Casemiro e Neymar fora da partida. Tite manteve seu plano de jogo e viu sua equipe ameaçar a equipe da casa com contra-ataques bem encaixados e a imposição de um sistema defensivo sólido e eficiente. Não foram poucas as vezes em que o treinador falou sobre a importância de linhas bem fechadas e compactadas na frente da área e a tendência é que ele siga o mesmo caminho no Flamengo.
Com a ascensão de Vinícius Júnior meses antes da Copa do Mundo, Tite conseguiu encontrar um lugar para ele na Seleção Brasileira sem mexer muito no desenho tático da sua equipe. O 4-4-2/4-2-4 foi mantido e o Brasil conseguiu viver bons momentos no Catar com Lucas Paquetá mais recuado e uma formação que buscava deixar os jogadores mais confortáveis dentro de campo. As lesões dos laterais e algumas escolhas não funcionaram como todos nós sabemos. Por outro lado, certo é que Tite busca sim encaixar todos os talentos que tem à disposição na sua equipe. E isso pode ser um alento para o torcedor do Flamengo que ainda sonha em rever Pedro, Gabigol, Arrascaeta e companhia jogando bem mais uma vez.
Mesmo sem o título e com algumas escolhas ruins, o trabalho de Tite na Seleção Brasileira fala por si só. Além de ser o melhor nome disponível no mercado, é também o profissional certo para encontrar pontos fortes e potencializar os atletas que terá à disposição. Um bom exemplo disso é o trabalho feito no Corinthians durante a campanha do Brasileirão de 2015. Tite apostou num 4-1-4-1 de muita movimentação e fluidez que ainda é apontado como um dos seus melhores trabalhos. Vagner Love jogava mais à frente e abria espaços para as chegadas de Malcom, Renato Augusto, Elias e Jadson. Além disso, Fagner, Guilherme Arana (ou Uendel), Gil, Felipe, Bruno Henrique garantiam a solidez defensiva.
É lógico que a imagem de Tite saiu um pouco desgastada depois da Copa do Mundo e que a sua promessa de não trabalhar em 2023 antes do acerto com o Flamengo podem ser obstacúlos nesse início de processo. No entanto, o contexto pedia um treinador com a sua bagagem e as suas características. Resta saber se ele terá o tempo necessário para implementar seus conceitos e recuperar jogadores que ainda podem render demais com a camisa rubro-negra. Por hora, é possível que a exigente torcida do Flamengo se contente com a classificação para a próxima edição da Libertadores. Mas somente se o time render algo próximo daquilo que se espera dele. Essa é a grande missão de Tite. Recuperar e potencializar.
E ainda há a constante pressão de diretoria (em ano de eleição, lembrem-se) e da imprensa esportiva que ainda não compreende a necessidade de se dar tempo para que os processos aconteçam. Talvez seja por isso que Tite colocou objetivos mais domésticos nessa sua chegada ao Flamengo. Num clube onde qualquer coisa vira motivo para briga, desavença e mordidas nas virilhas alheias, é melhor baixar as expectativas do que colocar metas mais altas. Só assim para se ter paz e iniciar um trabalho que tem tudo para gerar grandes frutos.