Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa as escolhas de Eduardo Coudet e Fernando Diniz no jogaço desta quarta-feira (4)
“A bola pune”. A frase icônica de Muricy Ramalho resume muito bem o que aconteceu nesta quarta-feira (4). A virada épica sobre o Internacional de Eduardo Coudet e a classificação do Fluminense para a grande final da Libertadores passa diretamente pela eficiência e da frieza do elenco tricolor nos momentos mais tensos da partida. Mesmo num cenário completamente desfavorável e enfrentando um adversário que conseguiu explorar as suas deficiências, o time de Fernando Diniz teve uma daquelas noites que será lembrada por muito, mas muito tempo. Pela forma como a vitória foi construída, pela coragem do seu treinador e pelo fato do time simplesmente se recusou a perder.
Mas a classificação do Fluminense para a segunda final de Libertadores da sua história não pode ser explicada apenas pelo lado tático e técnico da coisa. Existe também o espírito de luta, a resiliência de quem se adapta e também o bafejo da sorte. Como ignorar as chances incríveis desperdiçadas por Enner Valencia? Como não falar das defesas de Fábio e da atuação absurda de Nino na proteção da área tricolor? E como não citar a estrela do jovem John Kennedy, talvez o grande nome dessa virada por todo o contexto envolvido? A única certeza que temos é a de que o Fluminense nunca deixou de acreditar que era possível. E isso foi provado nessa noite épica no Beira-Rio.
Ao mesmo tempo, também é preciso dizer que o Internacional (apesar dos erros nos momentos capitais e por algumas escolhas questionáveis de Eduardo Coudet) só valorizou a classificação do Fluminense. Rochet foi seguro quando acionado, Hugo Mallo segurou bem a onda no lado direito, o volante Jhonny se agigantou na frente da defesa e Maurício foi o jogador mais perigoso do escrete colorado nas duas partidas das semifinais. Parece pouca coisa agora, depois que o time foi eliminado e agora precisa se concentrar na busca por algo além de uma vaga na próxima Copa Sul-Americana. Mas que fique claro que o Inter tinha bola suficiente para ir mais longe nessa Libertadores.
Muito da partida do Fluminense desta quarta-feira (4) passa pela escalação das duas equipes. Temendo perder o meio-campo, Fernando Diniz optou pela escalação de Alexsander no lugar de John Kennedy, retornando ao 4-2-3-1 costumeiro com Ganso tendo mais liberdade por dentro e Keno e Jhon Arias nas pontas. Só que a grande sacada de Eduardo Coudet foi o posicionamento ofensivo e a valorização da posse. Alan Patrick recuava, puxava a marcação e abria espaços para Maurício sair da direita para dentro buscando o espaço às costas de André. Enner Valencia era a referência móvel no lado oposto e Wanderson explorou bem a insegurança de Guga na lateral. O Internacional começou melhor o jogo.
O escanteio que originou o gol de Mercado logo aos dez minutos (em lance infeliz de Fábio) nasceu justamente dessa movimentação no ataque. A postura do Internacional (que estava bem organizado no 4-1-3-2 costumeiro de Eduardo Coudet) não permitia que o Fluminense pudesse trocar passes como gosta. A alternativa encontrada pelos comandados de Fernando Diniz foi manter mais a posse da bola, soltar o veterano Marcelo para jogar no meio-campo (com Guga se juntando a Nino e Felipe Melo numa trinca de zagueiros). Mesmo assim, os espaços não apareciam. Cano tentou explorar mais as costas de Vitão e Mercado e Ganso recuou para fugir da forte marcação de Aránguiz e Jhonny.
Fernando Diniz começou mudar o panorama da partida logo depois do intervalo, quando sacou Felipe Melo e Alexsander e mandou John Kennedy e Martinelli para o jogo, retornando ao ofensivo 4-2-4 do jogo de ida, no Maracanã. E vale aqui destacar que o Fluminense não parecia se importar com os “efeitos colaterais” das mexidas do seu treinador. Mesmo cedendo espaços demais no seu campo defensivo, o Tricolor das Laranjeiras foi se aproveitando do cansaço e do recuo excessivo do Internacional. Jhon Arias, Cano, John Kennedy e Keno tiraram a superioridade numérica da defesa colorada e ganharam em Marcelo mais um grande reforço para pensar as jogadas no meio-campo.
Além da parte tática, vinha também o imponderável, com as chances incríveis que Enner Valencia desperdiçou na frente de Fábio. Mas as substituições surtiram efeito. John Kennedy foi o responsável por abrir espaços na defesa colorada e infernizou a vida de Vitão e Mercado. E toda a jogada do gol de empate (marcado pelo camisa nove) começa quando o Fluminense está organizado numa espécie de 3-3-1-3 bem aos moldes de Marcelo Bielsa (tendo em Marcelo o seu ponta de lança). Desde o passe para o meio, o corta-luz do camisa doze, a temporização de Cano no lance e o “facão” de John Kennedy, tudo nesse gol traz um pouco daquilo que Fernando Diniz pensa sobre futebol.
A virada veio com Germán Cano completando jogada que começou ainda no campo de defesa e que contou com a participação de quase todo o time do Fluminense. Seis minutos de um futebol coletivo, vistoso e altamente eficiente. Ao mesmo tempo, o elenco das Laranjeiras mostrou frieza e concentração para superar as adversidades e se manter fiel ao seu estilo e ao plano de jogo do seu treinador. Do outro lado, Eduardo Coudet via seu principal jogador desperdiçar chances de matar o jogo e se atrapalhava novamente com a falta de opções no banco de reservas. Difícil não observar nas saídas de Maurício e Aránguiz como o início da queda da sua equipe num Beira-Rio completamente lotado.
A grande lição que fica dessa semifinal épica em Porto Alegre reside nas sábias palavras de Muricy Ramalho. A BOLA PUNE. E com toda a força do mundo. A classificação heroica do Fluminense passa muito por essa palavrinha mágica: EFICIÊNCIA. E entender isso é entender como Fernando Diniz vem conseguindo transformar sua equipe numa das melhores da América do Sul no momento com uma proposta ofensiva e vistosa de jogo, algo que agrada os olhos de quem gosta e aprecia o velho e rude esporte bretão. O Flu está a um simples passo de conquistar a “Glória Eterna” pela primeira vez. E com toda a justiça desse planeta.