Home Futebol Afinal de contas, o que foi que aconteceu com o bom futebol do Brasil nessa Copa do Mundo Feminina?

Afinal de contas, o que foi que aconteceu com o bom futebol do Brasil nessa Copa do Mundo Feminina?

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira aponta os problemas da Seleção Feminina e os erros na estratégia de Pia Sundhage

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.

A resposta rápida para a pergunta do título da nossa humilde análise é simples. Pia Sundhage fez escolhas terríveis para os jogos contra França e Jamaica e as jogadoras não conseguiram resolver dentro de campo. Principalmente as veteranas. Faltou controle dos nervos e faltou mais confiança por parte da treinadora sueca no processo de renovação que ela mesma iniciou. Na prática, faltou um pouco de tudo que eu e você vimos num ciclo que se mostrava altamente promissor. Não era absurdo nenhum acreditar que o Brasil poderia ir longe no Mundial da Austrália e na Nova Zelândia. E talvez seja por isso que a eliminação foi tão surpreendente. E melancólica também.

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Este que escreve confessa que demorou mais do que o normal para escrever esse texto por uma série de motivos. É difícil entender o que aconteceu depois da chegada da goleada sobre o Panamá. Todo o estilo mais solto da Seleção Feminina deu lugar a um jogo modorrento e sem ideias. Tudo bem que os adversários seguintes do Brasil na Copa do Mundo Feminina eram bem mais fortes do que as panamenhas, mas a forma como a equipe simplesmente se entregou em campo ainda provoca perguntas em todos aqueles que acompanham a modalidade. Além disso, Pia Sundhage ainda precisa responder por que abriu mão das novatas e privilegiou as veteranas quando o cenário pedia juventude e fôlego.

Por outro lado, é preciso deixar bem claro que a eliminação precoce do Brasil também passa pelas jogadoras. Falo mais especificamente das veteranas, justamente aquelas que deveriam chamar a responsabilidade e servir de referência para as novatas. E vale lembrar também que, apesar da atuação abaixo da média (principalmente no segundo tempo), a Seleção Feminina criou chances sim. Este que escreve não gosta muito do encaixe entre Marta e Debinha no ataque brasileiro, mas o time começou bem o jogo contra a Jamaica. O 4-4-2/4-2-4 de Pia Sundhage controlava bem a posse da bola e encontrava espaços com Ary Borges e Adriana jogando mais por dentro e os avanços de Tamires.

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Pia Sundhage manteve seu 4-4-2/4-2-4 com Adriana e Ary Borges ajudando Kerolin no meio e Tamires encontrando muito espaço pelo lado esquerdo. Foto: Reprodução / YouTube / CazéTV

O Brasil encontrava espaços por dentro e pelas laterais e sempre levava vantagem sobre a Jamaica quando tocava a bola com calma. Aliás, esse é um elemento importante nessa nossa história. Tivessem algumas jogadoras mais calma em várias tomadas de decisões, hoje estaríamos nos preparando para um confronto nas oitavas de final. Ainda no primeiro tempo, Marta poderia ter deixado Ary Borges na cara do gol por DUAS VEZES, mas preferiu a jogada individual. Tamires poderia ter feito o cruzamento para dentro, mas preferiu o chute desequilibrado. Fora os vários toques de calcanhar e firulas completamente desnecessárias num cenário que pedia mais seriedade e objetividade.

Ary Borges recuava, Marta segurava as zagueiras e Tamires avançava. O Brasil encontrou espaços na defesa jamaicana, mas pecou nas tomadas de decisão. Foto: Reprodução / YouTube / CazéTV

Depois dos 38 minutos do primeiro tempo, o Brasil simplesmente parou. As jogadoras não se entendiam e o nervosismo que já era evidente ficou completamente escancarado. E se as coisas já estavam complicadas, o cenário ficou ainda pior no intervalo. Este que escreve até entende a entrada de Bia Zaneratto por conta da estatura e pela presença de área e pelo bom chute de média e longa distância. No entanto, a saída de Ary Borges simplesmente destruiu o meio-campo brasileiro. Pia Sundhage poderia ter sido mais ousada com a entrada da camisa 16 no lugar de Luana (que fez uma péssima Copa do Mundo) ou até mesmo apostar em Angelina ou Duda Sampaio para dar mais liberdade para Kerolin.

O ponto em questão aqui é algo que já foi batido aqui neste espaço mais uma vez. Na hora H, Pia Sundhage não quis bancar o processo de renovação que ela mesma iniciou. O motivo? Ninguém sabe (ainda). O que é certo é que a entrada de Bia Zaneratto como ponta pela esquerda simplesmente tirou o espaço que Tamires tinha para avançar. Sem Ary Borges, Kerolin ficou sobrecarregada no meio e Adriana permaneceu mais isolada na direita, já que Antônia pouco subia. A inversão para um 2-3-5 só serviu para facilitar a vida das jamaicanas que fizeram jogo corretíssimo para quem carregava o regulamento debaixo do braço. Destaque para a goleira Rebecca Spencer, sempre muito segura.

A entrada de Bia Zaneatto e a saída de Ary Borges bagunçaram o meio-campo brasileiro. O time perdeu a jogada forte com Tamires pela esquerda. Foto: Reprodução / YouTube / CazéTV

Conforme o tempo ia passando, o nervosismo ia aumentando na Seleção Feminina. E é interessante notar que o jogo pedia a juventude de Gabi Nunes, Bruninha e Duda Sampaio. Destas, apenas a volante do Corinthians entrou em campo, mas apenas aos 36 minutos da segunda etapa. Ela, Geyse e Andressa Alves foram para o jogo nos lugares de Luana, Antônia e Marta numa tentativa desesperada de Pia Sundhage de dar mais presença de área e melhorar o passe da sua equipe. No entanto, o Brasil continuou refém do nervosismo e da falta de conjunto mesmo com cinco atacantes empilhadas na última linha. Enquanto isso, a Jamaica apenas administrou o tempo e não sofreu muitos sustos.

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Duda Sampaio, Geyse e Andressa Alves foram para o jogo, mas o Brasil perdeu organização e força ofensiva. Mesmo com cinco atacantes em campo. Foto: Reprodução / YouTube / CazéTV

É óbvio que boa parte da culpa pela eliminação precoce da Seleção Feminina da Copa do Mundo cai sobre os ombros de Pia Sundhage. Difícil entender o que levou a treinadora sueca a ignorar solenemente o processo de renovação que ela mesmo havia iniciado. Por que jogadoras como Mônica Hickmann, Andressa Alves e Luana estavam à frente de Bruninha, Gabi Nunes e Duda Sampaio, por exemplo? E por que as veteranas pareciam muito mais nervosas do que as novatas? E o principal: o que aconteceu depois do jogo contra a França? Para este que escreve, ficou claro que alguma coisa aconteceu nos bastidores depois da bronca sem sentido algum de Andressa Alves em Lauren dentro de campo.

Certo é que faltou bola, faltou leitura de jogo por parte de Pia Sundhage e faltou mais entendimento de que o futebol é um ESPORTE COLETIVO por parte de várias jogadoras ali. Difícil não pensar numa mudança no comando técnico. Mas ela não vai surtir o efeito necessário se a mentalidade não mudar dentro do elenco. E desta vez, não adianta apontar dedos para a CBF. Desta vez, a entidade deu sim estrutura, condições de trabalho e visibilidade para a Seleção Feminina. Faltou justamente o elemento básico de todo time campeão: futebol bem jogador. Simples assim.

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