Convocação da Seleção Feminina indica clara preocupação com o que virá pela frente na Copa do Mundo
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira destaca as escolhas de Pia Sundhage para as partidas contra Inglaterra e Alemanha
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira destaca as escolhas de Pia Sundhage para as partidas contra Inglaterra e Alemanha
Este que escreve nunca considerou o trabalho de Pia Sundhage à frente da Seleção Feminina perfeito e livre de críticas. A equipe ainda tem problemas que precisam de solução rápida e a campanha na She Believes Cup (nas partidas contra Japão, Canadá e Estados Unidos) comprova essa tese. Por outro lado, já é público e notório que o time tem sim um padrão de jogo bem definido e muito mais organização em todos os setores. Ao contrário do que alguns colegas afirmam, não existe “desrespeito à essência do futebol brasileiro” ou qualquer tentativa de se limitar a qualidade desta ou daquela jogadora. Certo é que a Seleção Feminina tem sim um caminho e já se mostra mais pronta para novos desafios.
Isso, no entanto, não quer dizer que o Brasil seja favorito ao título da Copa do Mundo da Austrália e da Nova Zelândia. O que poucos entendem é o contexto no qual o nosso futebol feminino está inserido. E a lista de convocadas divulgada por Pia Sundhage na última segunda-feira (20) tenta se adaptar a esse cenário. Lembrem-se de que a treinadora sueca ainda corre atrás de volantes confiáveis para jogar no seu 4-4-2/4-2-4. Angelina dificilmente vai se recuperar a tempo do Mundial, Duda Sampaio vem de lesão e Luana Bertolucci ainda não recuperou o futebol dos tempos de Paris Saint-Germain. Como se vê, há coisas que não dependem exclusivamente da treinadora sueca.
Não foi por acaso que Kerolin foi recuada para formar dupla com Ary Borges na proteção da zaga e que Adriana chegou a ser testada na She Believes Cup (e não foi bem). Como se sabe, a grande missão de Pia Sundhage é fazer com que as jogadoras da Seleção Feminina entendam seu papel COM E SEM A BOLA. Dentro desse quesito, precisamos exaltar as atuações de Bia Zaneratto na última Data FIFA. Mesmo jogando numa posição na qual não vem jogando, a atacante do Palmeiras se saiu muito bem na marcação e fez exatamente aquilo que uma jogadora de primeiro nível desse fazer. Talvez essa mudança de chave por parte da Imperatriz tenha sido a grande notícia dessa She Believes Cup.
Não é novidade pra ninguém que é esse o comportamento que Pia Sundhage quer das suas jogadoras dentro de campo justamente por saber que as principais equipes do planeta jogam dessa forma. Intensidade nas transições, marcação forte e concentração altíssima em cada lance. Tudo para entender quais são os melhores caminhos para a Seleção Feminina chegar na área adversária. E nesse ponto, por mais que o time tenha feito uma She Believes Cup abaixo do esperado, a treinadora sueca teve espaços para testes e novas formações. O final da partida contra os Estados Unidos nos mostra uma espécie de 4-1-4-1 com Marta mais por dentro e Kerolin iniciando a saída de bola junto da defesa.
Analisar o Brasil ou qualquer outra seleção que vai participar da Copa do Mundo também é analisar contextos. Não se separa uma coisa de outra. E não é preciso ser um defensor ferrenho do trabalho de Pia Sundhage para perceber isso. Cada crítica precisa levar em consideração todo o cenário onde a Seleção Feminina está inserida. A lista de convocadas mostra isso. Se Antônia (jogadora que sabe fazer muito bem o papel de “lateral-base” na variação do 4-4-2 para o 3-4-2-1 na equipe) já está recuperada de lesão, Tainara e Lorena se lesionaram e não vão entrar em campo nessa Data FIFA. O caso da goleira do Grêmio, inclusive, é bem grave.
Fora isso, vocês devem se lembrar que Pia Sundhage também fez testes nas jogadoras que atuam pelos lados do campo. Por conta das características das laterais (sempre mais ofensivas e sem tanta força nos duelos individuais), a treinadora sueca ainda busca pontas que tenham condição de fazer a cobertura defensiva e ainda aparecer no ataque. Bia Zaneratto pode ser uma alternativa, mas como abrir mão do seu talento perto da área adversária? Sem Debinha (mais uma lesionada), Pia foi na base da Seleção Feminina e optou pela convocação da jovem e altamente promissora Aline Gomes. E pelas últimas atuações da atacante da Ferroviária, é sim um bom teste.
Eu e você sabemos que Pia Sundhage vem tentando se adaptar às características das jogadoras que tem à disposição. Os testes feitos com Adriana na “volância” nada mais são do que uma tentativa de se encontrar dentro do elenco brasileiro a jogadora que possa fazer mais de uma função. Não é por acaso que a Seleção Feminina se comportou bem jogando com Antônia mais fixa com relação a Tamires numa variação para um 3-1-4-2 que trazia Duda Sampaio na frente da zaga e Ary Borges se projetando mais para o ataque. Geyse fazia o papel de uma ala pela direita e Tamires aproveitava bem o corredor aberto por Adriana. Não é exagero afirmar que o time teve seus melhores momentos em 2022 jogando dessa forma.
É óbvio que o objetivo é recuperar a consistência apresentada nos amistosos contra Noruega e Itália e (principalmente) do primeiro tempo contra a Suécia. Mas é sempre preciso levar em consideração o fato de que Pia Sundhage simplesmente não consegue ter todas as suas jogadoras à disposição. Se Antônia está apta, Tainara não está. Se Duda Sampaio se recuperou de lesão, Ludmila está fora da temporada. Não é difícil concluir que fica difícil para qualquer treinador do mundo montar uma seleção nessas condições. E ainda assim, a Seleção Feminina mostra um bom nível de competitividade e de consistência contra adversários mais fortes, mais entrosados e muito mais estruturados. Não é pouca coisa não.
A Finalíssima contra a Inglaterra e (principalmente) o amistoso contra a Alemanha vão ser ótimos testes para a equipe comandada por Pia Sundhage. São duas seleções extremamente competitivas e favoritas ao título da Copa do Mundo Feminina e vão exigir demais do Brasil. Há como se criticar o trabalho da treinadora sueca sem nenhum problema. Mas quando não se leva o contexto em consideração, cada palavra soa muito mais como “tentativa de engajamento” do que uma análise mais séria.