Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira explica como o maior ídolo da história do Vasco encontrava espaços para fazer tantos gols
Roberto Dinamite nos deixou no último domingo (8) e deixou todos os fãs do velho e rude esporte bretão órfãos do seu talento, da sua genialidade e dos seus gols. Foram 708 apenas vestindo a camisa do Vasco da Gama, clube onde se transformou em ídolo e lenda. E como todo grande nome do futebol mundial, Carlos Roberto de Oliveira também deixou um legado imenso para as atuais e futuras gerações. Ver e rever os vídeos antigos, buscar os pequenos detalhes e entender como ele conseguia encontrar espaços com tanta facilidade e furar defesas intransponíveis é uma verdadeira aula. E nesse ponto, podemos sim afirmar que Roberto Dinamite foi o último centroavante clássico que esse mundo viu.
Isso porque a simplicidade era um dos seus maiores trunfos diante dos zagueiros adversários. Notem que essa era a característica de outros grandes atacantes que vieram antes e depois de Roberto Dinamite. Por outro lado, pouquíssimos transformaram isso numa marca registrada. Bastava um passo em qualquer direção para encontrar o espaço para a finalização ou para a arrancada fulminante na direção do gol. E tudo isso começou no ano de 1971, quando chamou a atenção do técnico Mário Travaglini nas categorias de base do Vasco. O golaço marcado na vitória sobre o Internacional apenas abriu o caminho para a “explosão” do “garoto dinamite”, alcunha que recebeu do tradicional Jornal dos Sports.
O primeiro grande título veio quando Roberto tinha apenas vinte anos. E justo o primeiro Campeonato Brasileiro da história do Vasco. Naquele tempo, ele já era o dono da camisa 10 e jogava num 4-3-3 tradicional daqueles tempos, mas já mostrando todo o talento com e sem a bola. Do outro lado, estava “apenas” o Cruzeiro de Dirceu Lopes, Palhinha, Piazza, Perfumo e Nelinho. Roberto Dinamite não marcou gols na decisão, mas contribuiu demais saindo da área e abrindo espaços para os avanços de Ademir, Jorginho Carvoeiro e Luis Carlos. Aliás, não é errado afirmar que o comportamento dentro de campo já se assemelhava aos “falsos nove” que vemos hoje em dia no futebol mundial.
Foi convocado para a Seleção Brasileira pela primeira vez em 1975 e esteve presente na Copa do Mundo de 1978, na Argentina. Depois de dois jogos na reserva (nos empates contra Suécia e Espanha), Roberto Dinamite virou titular contra a Áustria e não saiu mais do time. No 4-2-2-2 de Cláudio Coutinho (onde Dirceu recuava da ponta para o meio-campo e abria espaços para as descidas de Rodrigues Neto), mostrou sua capacidade de abrir espaços nas defesas adversárias dando apenas um passo para o lado em qualquer direção. Ao mesmo tempo, ao buscar mais o lado esquerdo, abria o corredor para que Jorge Mendonça, “Búfalo” Gil e até mesmo Toninho Cerezo pudessem atacar a área adversária.
Marcou dois gols contra a Polônia na última rodada da segunda fase da Copa do Mundo no melhor estilo “centroavante nato”: se posicionando atrás da defesa e abrindo espaço para que seus companheiros de equipe pudessem atacar a área adversária. Dirceu circulava por todo o campo para armar o jogo, Jorge Mendonça se lançava na direção da área em alta velocidade e Gil saía da direita para o meio às costas do lateral adversário. Toda essa dinâmica ofensiva só foi possível graças ao talento de Roberto Dinamite e à sua capacidade única de abrir espaços nas defesas mais intransponíveis. Pena que a Seleção Brasileira não tenha conseguido ir além do “título moral” do Mundial da Argentina.
A passagem pelo Barcelona durou apenas, mas ela acabou trazendo um Roberto Dinamite renovado e ainda mais genial. A goleada sobre o Corinthians no dia 5 de maio de 1980 nos mostrou um atacante mais experiente e mais inteligente. Num time que contava com Mazarópi, Carlos Alberto Pintinho e Guina, o camisa 10 marcou todos os cinco gols do Vasco e fez a alegria dos mais de 107 mil torcedores presentes no Maracanã. Nesse jogo, veríamos todo o oportunismo e toda a capacidade de romper defesas de Roberto Dinamite na base do drible, da movimentação e (principalmente) das arrancadas na direção da área adversária. Na prática, meus amigos, um centroavante no seu estado mais puro.
Roberto Dinamite foi convocado para a Copa do Mundo de 1982, mas não entrou em campo. Anos depois, revelaria (em entrevista à Rádio Nacional) que uma das suas grandes frustrações foi não ter entrado em campo na Espanha e ter feito dupla com Zico, rival nos gramados e grande amigo fora deles. Poderia ter sido convocado para o Mundial do México (em 1986), mas acabou fora da lista final de Telê Santana mesmo estando em grande fase no Vasco. E o passar do tempo não diminuiu o talento e a genialidade do camisa 10 do Gigante da Colina. Como todo craque, foi se adaptando e encontrando seu espaço dentro de campo. Às vezes como centroavante. Às vezes como um “enganche” bem moderno para aqueles tempos.
Para aproveitar o talento de um Roberto Dinamite que já tinha seus trinta e poucos anos e de um jovem chamado Romário, Antônio Lopes posicionou o camisa 10 como uma espécie de ponta de lança que recuava para abrir espaços na frente da área. Sem a bola, Dinamite era o homem mais avançado. Com a bola, ele poderia dar profundidade e arrastar os zagueiros para trás ou voltar e abrir o corredor central para um Romário endiabrado sair na cara do gol. Some a isso o talento de Geovani no meio-campo e a velocidade de Mauricinho pelos lados do campo. Na prática, Roberto Dinamite jogou como um “falso nove” bem próximo do que vemos hoje em dia em várias e várias equipes do Brasil e do mundo.
Dinamite ainda teria boas passagens pela Portuguesa de Desportos e pelo Campo Grande antes de pendurar as chuteiras em 1993 num amistoso do Vasco com o La Coruña. Seus números são absurdos até mesmo para os dias atuais. É o maior artilheiro da história do Brasileirão (190 gols), maior artilheiro do Campeonato Carioca (279 gols) e maior artilheiro de São Januário (184 gols). Fora as inúmeras conquistas em mais de 20 anos de carreira. Roberto Dinamite não é apenas o maior ídolo do Vasco em todos os tempos. É o último dos centroavantes clássicos do futebol mundial. Clássico, letal com a bola no pé e dono de uma capacidade única de abrir defesas. Vai fazer falta com toda a certeza.
FONTES DE PESQUISA:
RSSSF Brasil / Arquivo da Seleção Brasileira
Site oficial da FIFA
Os 55 maiores jogos das Copas do Mundo, de Paulo Vinícius Coelho (Panda Books)
Escola Brasileira de Futebol, de Paulo Vinícius Coelho (Editora Objetiva)
As melhores Seleções Brasileiras de todos os tempos, de Milton Leite (Editora Contexto)