Luiz Ferreira destaca o trabalho do novo comandante do Vozão no Coritiba e no Nacional do Paraguai na coluna PAPO TÁTICO
Não é errado pensar que a chegada de Gustavo Morínigo ao Ceará marca o início de um planejamento que tem no retorno à elite do futebol brasileiro como o grande objetivo. Pelo menos, essa é a ideia da diretoria do Vozão. A conquista do acesso para a Série A com um honroso terceiro lugar na Série B de 2021 e a conquista do Campeonato Paranaense desse ano pelo Coritiba credenciam o paraguaio para a complicada tarefa. Mas é bom deixar claro que o treinador tem ideias e conceitos muito claros e sabe o que pedir das suas equipes, além de ter capacidade de se adaptar às características do elenco que tem à sua disposição. Gustavo Morínigo pode ser o nome certo na hora certa para o Ceará.
A maioria dos torcedores conhece o novo treinador do Vozão por conta do seu trabalho no Coritiba. Mas é possível dizer que, apesar de ter apenas 45 anos, ele tem uma boa experiência internacional. Foi sob seu comando que o Nacional do Paraguai chegou ao vice-campeonato da Libertadores em 2014 (quando “El Tricolor” foi superado pelo San Lorenzo). Gustavo Morínigo sabe montar equipes competitivas e tem um bom repertório tático. Não foi por acaso que o Coxa incomodou bastante os clubes da primeira prateleira do futebol nacional no Brasileirão de 2022.
Geralmente suas equipes jogam num bloco médio de marcação e se defendem em duas linhas com quatro jogadores. Seu Coritiba jogava dessa maneira e sempre criou problemas para os ataques adversários com as perseguições curtas no campo de defesa. Gustavo Morínigo trabalha bastante essa pressão no portador da bola e a retomada da posse para iniciar logo os contra-ataques enquanto seu adversário ainda está desorganizado. Um zagueiro ou um lateral podem saltar da última linha para fechar uma linha de passe com a cobertura dos volantes ou pontas.
No ataque, o Coritiba não era um time que gostava tanto de ficar com a bola. O estilo era mais vertical do que propriamente de valorização da posse, mas isso não quer dizer que não quer dizer que o Coxa comandado por Gustavo Morínigo era uma equipe sem ideias. Era muito comum ver o time do Couto Pereira concentrando jogadores no setor onde está a bola para fazer a inversão para o outro lado (seja na direção de um ponta ou de um lateral). Além disso, a equipe Coxa Branca também trabalhava bem a profundidade no ataque. Pelo menos três jogadores prendem os zagueiros adversários e abrem espaço para o avanço de um outro jogador nas costas da última linha. Era dessa forma que o Coritiba criava espaços.
É possível dizer que Gustavo Morínigo é um treinador que presa muito a objetividade e a simplicidade nas suas equipes. Sob seu comando, o Coritiba incomodou bastante as equipes da primeira prateleira do futebol brasileiro com esse estilo mais vertical e marcado por diversas jogadas de ultrapassagens. Um ponta abria o corredor para a subida de um dos laterais ou o atacante (geralmente alguém que saiba segurar a bola e fazer bem o trabalho de pivô na intermediária) recebe o passe longo e espera a entrada dos meios-campistas em diagonal na direção do gol.
O Nacional do Paraguai (clube onde Gustavo Morínigo realizou seu melhor trabalho) jogava de maneira semelhante ao Coritiba. Duas linhas com quatro jogadores marcando em bloco médio, perseguições mais curtas e um estilo mais objetivo de jogar, sem muita valorização da posse. Na Libertadores de 2014, “El Tricolor” conseguiu dois empates com o Atlético-MG de Ronaldinho Gaúcho, Otamendi e Paulo Autuori ainda na fase de grupos e eliminou Vélez Sarsfield, Arsenal de Sarandí e o Defensor do Uruguai até chegar na grande final contra o San Lorenzo.
Gustavo Morínigo conseguiu implementar seu estilo de jogo mais característico de jogadas de ultrapassagens e de ataque do espaço num time que contava com nomes como Marcos Melgarejo, Julian Benítez, Fredy Bareiro e com um jovem zagueiro chamado Fabián Balbuena como reserva imediato para a defesa. Não era raro ver um dos pontas vindo por dentro e puxando a marcação adversária para abrir espaços às costas da última linha e na frente da área adversária. Foi assim que o Nacional do Paraguai conseguiu se manter vivo num grupo complicado e ir superando seus adversários até a grande decisão. Esse vice-campeonato é até hoje o melhor resultado de “El Tricolor” na Copa Libertadores da América.
É verdade que o trabalho terá que ser feito praticamente do zero. Além das chegadas de Albeci Júnior (novo diretor de de futebol) e Juliano Camargo (novo executivo de futebol), o Ceará já confirmou as saídas de Matheus Peixoto, Nino Paraíba, Fernando Sobral, Messias, Mendoza, Diego Rigonato, Richard Coelho, Marcos Victor e Bruno Pacheco. Além disso, o rebaixamento para a Série B também provocou uma diminuição drástica nas receitas do Vozão. É esse o cenário que Gustavo Morínigo encontra no clube para iniciar o trabalho visando 2023. Conforme mencionado anteriormente, o treinador paraguaio terá muito trabalho pela frente. Tempo e paciência serão fundamentais para que as coisas aconteçam.
Nenhum processo de reconstrução é fácil. Ele requer dedicação, foco e muito suor. Nesse ponto, Gustavo Morínigo pode sim ser o nome certo para o Ceará por conta de seus últimos trabalhos e da forma que pensa o futebol. Mesmo assim, a situação do Vozão (dentro e fora de campo) não permite muitas aventuras e/ou experimentações. Pensar dia a dia, jogo a jogo e usar bem o elenco que terá à disposição são pontos fundamentais nesse momento. Ainda mais com tudo recomeçando praticamente do zero.