Home Futebol As lições que a campanha na Copa do Mundo de 1994 deixam para a Seleção Brasileira e seu futuro técnico

As lições que a campanha na Copa do Mundo de 1994 deixam para a Seleção Brasileira e seu futuro técnico

Luiz Ferreira destaca o processo de construção do grupo vencedor do tetracampeonato mundial na coluna PAPO TÁTICO

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.

Carlo Ancelotti, Dorival Júnior, Mano Menezes, Fernando Diniz, Rogério Ceni, Abel Ferreira, Jorge Jesus e Pep Guardiola. Os nomes ventilados para substituir Tite no comando da Seleção Brasileira quase enchem os dedos de duas mãos. É natural que especulações desse tipo tomem conta do noticiário do futebol nacional nesse final de 2022 por conta da campanha decepcionante na Copa do Mundo do Catar. Só que o passado recente nos mostra que defender o discurso de “terra arrasada” não é uma escolha lá muito sábia. É nesse sentido que a campanha vitoriosa do Mundial de 1994 traz lições valiosas a Seleção Brasileira e seu futuro treinador (seja ele quem for).

A ideia aqui não é realizar uma ode ao passado, mas entender como os protagonistas de décadas passadas conseguiram superar todos os obstáculos até atingir o objetivo principal ao se depararem com um cenário semelhante ao atual. Em 2026, o Brasil vai igualar o jejum de conquistas da Copa do Mundo que Romário, Bebeto, Carlos Alberto Parreira e companhia tinham em 1994, nos Estados Unidos. Estamos falando de 24 anos sem conquistas da maior competição de futebol do planeta. A construção do grupo que finalmente nos deu o tão sonhado tetracampeonato é um ótimo exemplo de como é preciso ter calma, tranquilidade e prudência na condução de qualquer time.

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Quatro anos antes dos Estados Unidos, no entanto, a Seleção Brasileira vinha de uma eliminação doída para a Argentina de Maradona nas oitavas de final da Copa do Mundo da Itália. A equipe jogou num 3-5-2 com Jorginho e Branco soltos nas alas e fez jogos ruins contra Suécia, Costa Rica e Escócia na fase de grupos, mas teve sua melhor atuação justamente na derrota por 1 a 0 para a Albiceleste. Ao final da partida, o discurso era o de “terra arrasada”, de “crise” e de responsabilização de Sebastião Lazaroni e de boa parte do grupo que entrou em campo. Principalmente Dunga, que acabou virando “símbolo” de uma geração considerada fracassada por muita gente.

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A Seleção Brasileira fez a sua melhor partida na Copa do Mundo de 1990 na derrota para a Argentina. O 3-5-2 de Sebastião Lazaroni foi alvo de várias críticas durante o Mundial.

Notem como esse discurso se repete sempre que o resultado não é esperado. Há a caça às bruxas e o desejo de se apagar tudo e começar do zero sem tentar ao menos perceber o que o ciclo passado deixou de bom. E acreditem: sempre há coisas boas a serem resgatadas. E foi o que Carlos Alberto Parreira e sua comissão técnica fizeram depois de assumirem a Seleção Brasileira após a passagem irregular de Paulo Roberto Falcão e o vice-campeonato na Copa América de 1991. Vale destacar também que o grupo ainda contava com Taffarel, Mazinho, Ricardo Rocha e Branco, remanescentes da Copa do Mundo de 1990 e outros que fariam parte do grupo vitorioso em 1994.

Parreira reuniu os jogadores que considerava fundamentais e implementou um sistema de jogo altamente eficiente, baseado no toque de bola e na valorização da posse. Apesar dos tropeços(incluindo a derrota para a Bolívia em La Paz, a primeira do Brasil nas Eliminatórias), o comandante se manteve firme no seu projeto e viu sua equipe recuperar a confiança após uma verdadeira sapatada sobre a mesma Bolívia no Arruda. E para completar, Carlos Alberto Parreira ainda contornou a crise envolvendo Romário (que já jogava pelo Barcelona naquela época). O retorno do “Baixinho” se mostraria fundamental para que o Brasil conquistasse o tetra nos Estados Unidos.

Ainda haveria tempo para mais um resgate. Considerado o símbolo do fracasso em 1990, Dunga retornou para a Seleção Brasileira depois que Parreira o testou ao lado de Mauro Silva na goleada sobre a Venezuela em San Cristóbal. Seu 4-4-2 ganhou mais consistência e os laterais Jorginho e Branco (os mesmos da Copa da Itália!!!) ganharam mais liberdade para subir ao ataque. Ganhou a faixa de capitão e se transformou num dos jogadores mais importantes daquela Seleção Brasileira. Era ele quem dava o tom na saída de bola e quem levava a bola ao ataque com ótimos passes e boa condução pelo meio-campo além (é claro) da conhecida força na marcação.

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Mesmo indo contra boa parte da imprensa esportiva da época (que pedia um time mais solto no ataque), Carlos Alberto Parreira manteve sua aposta naquilo que acreditava que era o certo. A única vez em que cedeu foi na entrada de Mazinho no lugar de Raí a partir das oitavas de final (como Zagallo revelou em conversa com os colegas de TV Brasil há alguns anos). A Seleção Brasileira venceu Rússia e Camarões e empatou com a Suécia na fase de grupos. Superou os Estados Unidos no dia 4 de julho, venceu a poderosa Holanda de Bergkamp, Koeman, Overmars e Rijkaard e passou pela Suécia nas semifinais na melhor atuação coletiva da equipe na Copa do Mundo.

E na final, a Seleção Brasileira superou a Itália num jogo truncado, cheio de alternativas e que só foi decidido nas penalidades. Romário e Dunga (dois dos personagens principais na nossa análise) converteram suas cobranças, Taffarel (outro nome bastante contestado pela imprensa) defendeu a penalidade de Massaro. O grito de tetracampeão (como todos nós sabemos) veio com Roberto Baggio mandando seu pênalti pra longe da baliza. E tudo isso com uma equipe que, embora bastante criticada por boa parte da imprensa da época, ganhou a admiração de nomes como Pep Guardiola pela valorização da posse da bola e pela solidez defensiva apresentada naquela Copa do Mundo.

Carlos Alberto Parreira manteve suas convicções e montou uma Seleção Brasileira altamente competitiva em 1994. Até mesmo Pep Guardiola se mostrou admirador do futebol daquele time.

Conforme mencionado anteriormente, a ideia aqui não é fazer uma ode ao passado e reforçar o discurso que defende que “antigamente é que era bom”. O objetivo é mostrar que há como se tirar coisas boas de um cenário desfavorável e aproveitar peças de equipes que passaram longe de encantar. Do time que entrou em campo na grande final contra a Itália, Taffarel, Jorginho, Branco, Dunga, Aldair, Mazinho, Bebeto e Romário fizeram parte do grupo que disputou o Mundial de 1990 (na Itália). E o grande acerto de Carlos Alberto Parreira foi perceber que havia potencial no grupo de Sebastião Lazaroni e acomodar os jogadores dentro da sua proposta de jogo. Sem essa de “terra arrasada”.

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É verdade que muita coisa aconteceu de 1994 até aqui. Mas as lições ficam para sempre. E seja quem for que vá assumir o comando da Seleção Brasileira precisa ter em mente que Tite deixou sim um legado que pode ser muito bem aproveitado em termos de nomes usados nos dois ciclos e até mesmo modelos táticos. E este que escreve só espera que a história de 1994 se repita novamente em 2026. Com Neymar, Vinícius Júnior ou quem quer que esteja vestindo a amarelinha.

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