Palmeiras leva a Libertadores Feminina na base do talento individual e inicia mais uma bela história
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa as escolhas de Ricardo Belli e a goleada sobre o Boca Juniors
A conquista da Libertadores Feminina pelo Palmeiras pode ser analisada de várias maneiras. Difícil imaginar que as Palestrinas iriam fazer uma campanha perfeita no Equador depois da saída melancólica da equipe no Brasileirão Feminino e pelos problemas nos bastidores envolvendo as zagueiras Agustina e Thaís. No entanto, de um jeito ou de outro, o elenco se fechou e aproveitou bem o vácuo deixado pelo Corinthians (que acabou eliminado pelo finalista Boca Juniors nas quartas de final) para levar a primeira competição internacional da sua história. E com todos os méritos, diga-se de passagem. Foram seis vitórias em seus jogos, com 19 gols marcados e apenas três sofridos.
A caminhada rumo à Glória Eterna também trouxe seus momentos de tensão. A vitória sobre o Santiago Morning na bacia das almas e as dificuldades encontradas diante da Universidad de Chile e do América de Cali já indicavam que o Palmeiras tinha sim pontos fracos que poderiam ser explorados por equipes mais organizadas. E de fato, esse foi o panorama visto na primeira etapa da partida desta sexta-feira (28) diante de um Boca Juniors que chegava na decisão com a confiança lá no céu por conta da vitória sobre o Corinthians nas quartas de final.
Mesmo assim, as duas equipes entraram em campo sem muitas surpresas. O técnico Jorge Martínez manteve seu 4-3-3/4-1-4-1 básico com Yamilla Rodríguez e Priori pelos lados, linhas compactadas e muita força nos contra-ataques. Já Ricardo Belli apostou novamente num 3-4-1-2/3-4-3 que trazia Poliana, Júlia Bianchi e Katrine formando o trio defensivo, Bruna Calderan mais meia do que ala (veremos isso mais pra frente), Camilinha um pouco mais contida pela esquerda e muita movimentação no setor ofensivo com Ary Borges, Bia Zaneratto e Byanca Brasil.
O gol de Ary Borges (marcado logo aos quatro minutos do primeiro tempo) deu a impressão de que as Palestrinas não encontrariam muitos problemas pela frente. A questão é que o Boca Juniors fez aquilo que pouca gente havia feito até então: pressionar a saída de bola e explorar os espaços entrelinhas da equipe de Ricardo Belli. Aos 14 minutos, o VAR confirmou o gol de Priori (antes anulado por impedimento que não existiu). Com a igualdade no placar, o escrete xeneize adiantou um pouco a marcação e expôs a falta de compactação no Palmeiras. Não foram poucas as vezes em que o trio de zagueiras se viu obrigado a rifar a bola para o ataque diante da falta de opções.
Mesmo assim, o Palmeiras conseguia levar a bola para o campo ofensivo por conta da movimentação das suas jogadoras. Se Bia Zaneratto recuava, Duda Santos avançava e Andressinha buscava o espaço para fazer seus lançamentos buscando o ataque. Estratégia simples, mas que fez seus estragos. Ricardo Belli organizou melhor o escrete palestrino no intervalo e viu Byanca Brasil (importantíssima na marcação pela esquerda e nas transições ofensivas) marcar o segundo gol após bela jogada pela direita e mais uma bela assistência de Bruna Calderan.
Com as linhas mais compactadas, Poliana e Camilinha pelos lados e a camisa 2 mais avançada (jogando quase como uma ponta pela direita), o Palmeiras conseguiu controlar mais o jogo usando uma formação que mais lembrava um 4-4-2 sem a bola. Difícil não notar aqui que, apesar dos problemas já relatados aqui mesmo neste espaço, o escrete comandado por Ricardo Belli conseguia levar vantagem nos duelos por conta do talento individual das suas jogadoras. E numa competição de “tiro curto” como a Libertadores Feminina, isso é fundamental.
O gol de Poliana (marcado aos 12 minutos no segundo tempo) nasceu da forte jogada de bola parada tão trabalhada por Ricardo Belli nos treinamentos. Com a vantagem no placar, o Palmeiras trouxe suas linhas para trás e apostou num 5-4-1 que trazia Day Silva, Júlia Bianchi e Poliana formando o trio defensivo, Bruna Calderan e Katrine nas alas, Ary Borges e Carol Baiana fechando os lados e Bia Zaneratto (a mais jogadora mais avançada do escrete palestrino) puxando os contra-ataques. O Boca Juniors, por sua vez, ensaiou uma espécie de “abafa” sem muito sucesso. O Palmeiras controlava bem o jogo e garantia o título com méritos diante de um forte adversário.
Ainda haveria tempo para Bia Zaneratto aproveitar a falha das zagueiras Adriana Sachs e Mayorga para marcar o quarto gol palestrino aos 43 minutos do segundo tempo. Essa foi a senha para a festa alviverde começar em Quito. Mesmo com todos os problemas extracampo relatados pela mídia especializada no futebol feminino, o Palmeiras conseguiu encontrar força e manter o foco para aproveitar as chances que teve. Os excelentes números da equipe de Ricardo Belli falam por si só (ver no primeiro parágrafo). E por mais que a equipe tenha apresentado alguns problemas de ordem coletiva em alguns jogos, o que se viu foi o talento individual se fazendo presente quando foi necessário.
Eu e você vimos mais uma bela história começar a ser escrita nesta sexta-feira (28). Ainda que escrita de maneira intempestiva e abrupta, mas que confirmou a hegemonia brasileira na Libertadores Feminina. Certo é que o Palmeiras tem “bala na agulha” para fazer muito mais pela modalidade e se manter no topo por um bom tempo. Basta ter a boa vontade que muitos não tiveram no passado.