A lista de convocadas para os amistosos da Seleção Feminina contra Noruega e Itália (nos dias 7 e 10 de outubro) seguiu a linha traçada por Pia Sundhage após a Copa América. Não é segredo pra ninguém que a treinadora sueca ainda busca o equilíbrio necessário na equipe e as jogadoras que melhor executem seus conceitos dentro de campo. Além disso, as ausências de Angelina e Luana (ambas lesionadas) fez com que algumas alterações no desenho tático básico da Seleção Feminina fossem realizadas já nos dois amistosos contra a África do Sul. Esse contexto atual também ajuda a explicar a presença de atletas que participaram da Copa do Mundo Sub-20, na Costa Rica.
Não é difícil imaginar, por exemplo, Pia Sundhage usando Rafaelle como volante ao lado de Yaya ou retornando ao seu 4-4-2/4-2-4 tradicional com a jovem volante do São Paulo atuando ao lado de Ana Vitória. Claro que tudo vai depender do cenário que as duas partidas vão apresentar e do tipo de teste que a treinadora sueca pretende fazer nesses dois amistosos. No entanto, toda convocação traz seus recados implícitos e não seria diferente com a Seleção Feminina. A entrevista coletiva de Pia Sundhage está recheada deles.
Voltemos para a Copa América, realizada no mês de julho. Eu e você vimos o escrete canarinho jogar num 4-4-2 que trazia Angelina na frente da zaga, Ary Borges se lançando mais ao ataque, Kerolin e Adriana pelos lados e Bia Zaneratto e Debinha mais à frente. Apesar das atuações bem abaixo do esperado (na opinião deste que escreve), a Seleção Feminina conseguiu se impor diante se seus adversários e ficar com o título na Colômbia. A formação estava consolidada e bem encaixada na cabeça das jogadoras até aquele momento.
A seríssima lesão de Angelina e o longo período sem jogos de Luana mudaram completamente esse cenário. Isso porque Pia Sundhage não tinha mais volantes que pudessem “assobiar e chupar cana”, isto é, que pudessem cuidar da proteção da última linha e ainda iniciar a saída de bola. Essa mudança no contexto fez com que a treinadora sueca falasse em mudança no jeito de jogar e até em novas formações. As duas vitórias sobre a África do Sul nos mostraram uma Seleção Feminina que mantinha o 4-4-2 sem a bola e que se organizava num 3-4-2-1 com ela. Antônia se posicionava como zagueira pela direita, Adriana (ou Jaqueline) e Tamires foram as alas com Duda Sampaio e Ary Borges jogando por dentro.
O objetivo de Pia Sundhage era simples. A Seleção Feminina ganhava mais consistência na defesa com Antônia na zaga, qualidade no passe com Duda Sampaio ao lado de Ary Borges e mais mobilidade com um trio ofensivo que ocupava a entrelinha e criava profundidade nas jogadas de ataque. Ainda que o time tenha cometido erros bobos nas duas partidas contra a atual campeã africana, a nova formação fazia muito sentido diante das características das jogadoras que Pia Sundhage tem à sua disposição.
Isso ajuda a explicar a convocação de Tarciane, Lauren e Yaya para essa Data FIFA. Além da qualidade e das atuações dessas três jogadoras na Copa do Mundo Sub-20, todas mostraram boa compreensão dos conceitos táticos de Jonas Urias (que são muito parecidos com os trabalhados por Pia na equipe principal). E se formos observar a Seleção Brasileira que esteve na Costa Rica, vamos encontrar elementos como a utilização de uma lateral-base e uma volante que se transforma em meia de criação com a posse da bola.
Certo é que Pia Sundhage segue em busca de soluções e de meios que façam a Seleção Feminina subir definitivamente de patamar a nível mundial. As dificuldades contra equipes do primeiro escalão ainda vão existir por algum tempo por conta de todo o contexto. Quem acompanha o espaço aqui no TORCEDORES sabe que este que escreve já criticou diversas escolhas da treinadora sueca e apontou problemas em determinados setores. Por outro lado, uma Seleção Brasileira forte passa diretamente pela melhoria das nossas ligas e das condições de trabalho das nossas jogadoras e comissões técnicas. Só agora estamos vendo o Brasil realizando trabalho na base. E isso conta.
As críticas e a má vontade com o trabalho de Pia Sundhage vão continuar por bastante tempo. Entender suas escolhas (ainda que não se concorde com algumas delas) é entender o contexto e tudo o que ela pretende tirar das nossas jogadoras. As cobranças por intensidade, condições físicas, inteligência tática e boa execução deste ou daquele conceito não é implicância. É conhecimento de causa e ciência de que o futebol feminino de alto nível exige tudo isso. Trotar em campo, esquecer a marcação e só jogar com a bola no pé são atitudes que não têm mais espaço na Seleção Feminina. Esse recado já foi dado mais de uma vez, mas parece que tem gente que não quer entender.
Certo é que a lista de convocados da Seleção Feminina segue uma linha de pensamento e raciocínio bastante clara e que tenta se adaptar a todo o contexto explicado anteriormente. É possível sim exigir de Pia Sundhage que a Seleção Feminina jogue um futebol mais consistente. Mas é preciso entender como as coisas funcionam aqui por estas bandas. Há muito mais coisa além do discurso fácil de alguns jornalistas que transpiram má vontade nas redes sociais.