Não foi uma atuação de encher os olhos. O time comandado por Pia Sundhage ainda oscila demais durante um mesmo jogo e acumula tomadas de decisões erradas além do aceitável. Por outro lado, a vitória sobre a Venezuela nos apresentou a melhor versão da Seleção Feminina nessa Copa América até o momento. Ao contrário do que aconteceu contra o Uruguai, o Brasil se manteve ligado em todos os lances, executou melhor os conceitos trabalhados pela sua treinadora durante o jogo desta segunda-feira (18) e sofreu muito pouco. Aliás, é curioso que o escrete canarinho tenha jogado melhor contra o adversário que (em tese) exigira mais da equipe brasileira em todos os quesitos nessa fase de grupos da Copa América. Fato é que a Seleção Feminina fez por merecer o resultado em Armênia.
Já se sabia que a Venezuela comandada pela italiana Pamela Conti traria mais problemas do que a Argentina e que a ótima Denya Castellanos seria um ótimo teste para a dupla de zaga formada por Kathellen e Rafaelle. Ao invés da postura mais frouxa e desinteressada, a Seleção Feminina tentou se impor na partida desde o começo com a marcação mais alta, pressão pós-perda mais encaixada e muita mobilidade pelos lados do campo com as ultrapassagens de Antônia e Tamires no corredor aberto por Adriana e Kerolin. Mais atrás, Angelina e Ary Borges controlavam bem o meio-campo e ajudavam na organização das jogadas ofensivas.
A jogada do primeiro gol brasileiro na partida mostra bem como a equipe estava mais ligada em todas as ações do jogo e nas orientações de Pia Sundhage. Kerolin puxa a marcação para dentro e abre o espaço para onde Tamires se projeta para receber o passe de Rafaelle. A partir desse momento, todo o ataque da Seleção Feminina se organiza da seguinte forma. Debinha fica na entrada da área (aguardando o passe ou um rebote), Adriana arrasta sua marcadora para a direita e Bia Zaneratto aparece no meio da zaga venezuelana. O cruzamento sai preciso e a camisa 16 acerta uma bela cabeçada, sem defesa para a goleira Nayluisa Cáceres.
Por mais que a Venezuela se lançasse ao ataque e explorarasse a qualidade de Denya Castellanos, a Seleção Feminina se manteve firme na defesa e sofreu muito pouco. É verdade que o time como um todo ainda peca em determinados momentos pela falta de concentração e coordenação na marcação, mas o desempenho e a entrega das jogadoras era outro. E isso pôde ser facilmente observado no segundo tempo. Se Ary Borges se lançou como autêntica ponta de lança em contra-ataque fulminante no lance do segundo gol brasileiro, Gabi Portilho mostrou que pode sim ser opção para Pia Sundhage. Ainda mais quando a jogadora do Corinthians fez ótima dupla pelo lado direito com Antônia no desdobramento do 4-4-2 para o 4-2-4 nos momentos de posse de bola. O Brasil conseguia manipular facilmente as linhas da Venezuela.
É possível afirmar que eu e você vimos a melhor versão da Seleção Feminina na Copa América até o momento. Por mais que ainda exista a necessidade de se fazer ajustes mais finos em todos os setores, a equipe como um todo se comportou muito melhor do que nas partidas contra a Argentina e contra o Uruguai. Finalmente, vimos uma imposição do escrete comandado por Pia Sundhage na base da qualidade e do porte físico em cima de adversários (em tese) inferiores nesses quesitos. Também não deixa de ser curioso que o Brasil tenha jogado melhor e sofrido muito pouco contra o adversário mais forte do seu grupo na Copa América Feminina. A impressão que fica é que o receio de que o time poderia se complicar diante da Venezuela era considerável. Por isso o nível mais alto de concentração.
Há que se destacar também a maneira como a Seleção Feminina encaixou a marcação e realizou a pressão pós-perda. Mesmo com as entradas de Duda (do Flamengo), Geyse, Luana e Fê Palermo, o time não diminuiu o ritmo e se manteve focado no planejamento e nas orientações de Pia Sundhage. E foi possível notar também um padrão mais claro no posicionamento do Brasil nessa pressão. As volantes saltavam para tirar o espaço de ação das adversárias junto com a lateral e a “ponta” do lado onde está a bola. Mais à frente, a “ponta” do outro lado se aproxima e a dupla de ataque buscava atacar as costas da última linha da Venezuela. E o lance do quarto gol mostrou isso muito bem. Angelina rouba a bola, Gabi Portilho passa para Debinha e esta marca o gol mais bonito do jogo desta segunda-feira (18).
Além da vitória e da boa atuação coletiva (a melhor na Copa América na humilde opinião deste que escreve), Pia Sundhage também pode e deve comemorar as boas opções que ganhou na Seleção Feminina. Gabi Portilho se encaixa nesse quesito. A atacante do Corinthians é ótima alternativa para furar defesas bem fechadas e dar profundidade ao setor ofensivo. Luana parece recuperada da COVID-19 e distribuiu bons passes ao lado de Angelina. E Geyse é a atacante de força que pode segurar a bola no ataque para Bia Zaneratto circular por dentro como “camisa 10” de ofício. Seja como for, há como se fazer essa equipe jogar ainda mais e nos entregar mais intensidade e concentração nas partidas disputadas na Colômbia. A primeira etapa do desafio já foi cumprida. E a tendência é que o nível de dificuldade cresça ainda mais.
Principalmente quando se sabe que a Seleção Feminina é o time a ser batido nessa Copa América. É por isso que Pia Sundhage e todas as jogadoras precisam corrigir os problemas que ainda existem (a cobertura defensiva pela esquerda é um deles) e diminuir os erros de tomada de decisão. Jogos eliminatórios costumam trazer surpresas indigestas. Toda a atenção e cuidado é fundamental nesse momento.