“Eu realmente gostei do resultado, fizemos três gols e não tomamos nenhum. Mas não estou feliz com a nossa atuação, especialmente o ataque. Deveríamos ter sido mais efetivas. Não gostei do jogo, o Uruguai fez o seu trabalho muito bem, tentou dificultar o nosso jogo. Eu não gostei da nossa atuação, temos que melhorar“. As palavras de Pia Sundhage, na entrevista coletiva após a vitória da Seleção Feminina sobre o Uruguai por 3 a 0, resumem bem o que foi o jogo desta terça-feira (12). Embora o Brasil tenha conquistado a segunda vitória na Copa América Feminina na base do talento e do condicionamento físico, a impressão que fica é a de que muita gente ali ainda não entendeu o que está em jogo na competição. Não estamos falando de goleadas, mas de atuações seguras e de um desempenho satisfatório.
Eu e você sabemos muito bem que a Seleção Feminina é uma das grandes favoritas ao título da Copa América e que alguns adversários (por mais que o nível do futebol sul-americano tenha aumentado bastante nos últimos anos) não devem causar muitos problemas para a equipe de Pia Sundhage. Por outro lado, a treinadora sueca sabe que suas jogadoras podem entregar muito mais do que entregaram nesta terça-feira. Ainda que os 3 a 0 sobre o Uruguai tenham sido construídos com certa facilidade, o escrete canarinho como um todo baixou demais o nível de concentração e intensidade. Principalmente no segundo tempo, depois das substituições promovidas pela treinadora sueca e a vantagem no placar.
A partida começou em ritmo lento, com a Seleção Feminina encontrando certa dificuldade para furar o bloqueio defensivo do Uruguai. Estava mais do que claro que o time comandado por Pia Sundhage precisava se movimentar mais para abrir espaços e pisar na área do time comandado por Ariel Longo. As entradas de Antônia e Debinha deram mais mobilidade ao time, mas as coisas só começaram a fluir quando o Brasil começou a fazer o básico. Movimentação correta no terço final, trocas de passe mais precisas e valorização da posse de bola até encontrar o momento certo de atacar a área da boa goleira Sofía Olivera. Exatamente como aconteceu no lance do primeiro gol brasileiro (marcado por Adriana).
Vale destacar aqui o fato de que o 4-4-2 de Pia Sundhage só conseguia ser realmente efetivo no ataque quando Debinha e Bia Zaneratto acertava a movimentação ofensiva e buscava o espaço entrelinhas. Nesse ponto, as duas jogadoras são excelentes. Principalmente a atacante do Palmeiras. A construção de todo o lance do segundo gol da Seleção Feminina passa exatamente pelos pontos mencionados anteriormente. Há a troca de posições, a intensidade e a leitura dos espaços tão pedida por Pia Sundhage nos treinamentos e nas entrevistas coletivas. O time também ganhava volume com as subidas de Ary Borges ao ataque (num desdobramento para um 4-1-3-2). Mesmo assim, a sensação que ficava neste que escreve era a de que a Seleção Feminina jogava “para o gasto”. Exatamente como aconteceu contra a Argentina na primeira rodada.
Toda a jogada do terceiro gol (que começou com o passe de ruptura de Rafaelle para Debinha, teve Bia Zaneratto arrastando a marcação e Adriana aparecendo livre na segunda trave para balançar as redes) deixou a impressão de que a Seleção Feminina fosse realmente controlar mais a partida. No entanto, o time inexplicavelmente diminuiu o ritmo e a intensidade nas jogadas de ataque e praticamente parou de jogar. Uma coisa é administrar o placar e guardar fôlego para a sequência da competição. Outra é esquecer as orientações passadas pela comissão técnica e encarar a partida válida pela Copa América como “mais um” amistoso. A maneira como Belén Aquino entrou na área brasileira e encontrou Birizamberri no chute que parou na trave de Lorena é emblemático. E a postura do Brasil no lance diz muito.
Na prática, a Seleção Feminina só criou mais duas chances claras de gol depois que abriu três gols de vantagem no Estádio Centenário de Armênia. A primeira com um chute de Bia Zaneratto e a segunda com uma cabeçada de Kathellen. Muito pouco para uma equipe que é apontada como grande favorita ao título da Copa América. Está mais do que claro que uma das grandes missões de Pia Sundhage na equipe brasileira tem relação direta com a postura das jogadoras diante de adversários de menor expressão (como o Uruguai) e a maneira como esse time perde a concentração depois de abrir uma certa vantagem no placar. Isso ficou nítido nos amistosos contra França, Dinamarca e Suécia e pode ser um problema sério contra equipes mais qualificadas como a Venezuela (da ótima Denya Castellanos), a Colômbia e o Paraguai.
E a impressão que fica (apesar da superioridade da Seleção Feminina em todos os aspectos) é a de que muitas ali ainda não entenderam o que está em jogo na Copa América. Por mais que a qualidade de alguns adversários seja duvidosa, é preciso manter o foco, a concentração e a intensidade para sair vitorioso e atingir os objetivos. Fica até complicado falar sobre as formações usadas por Pia Sundhage, os motivos que levaram a treinadora sueca a escolher o time que mandou a campo e a estratégia traçada para derrotar o Uruguai se o desempenho dentro de campo está muito abaixo daquilo que eu e você já vimos contra oponentes muito mais fortes. Parece até que algumas ali pensam que os gols vão aparecer quando elas quiserem. E sabemos que o futebol não funciona assim.
Há como se destacar as atuações de Antônia, Adriana, Rafaelle, Angelina e Ary Borges. Mesmo assim, a Seleção Feminina como um todo segue devendo uma atuação convincente nessa Copa América e um desempenho de acordo com o potencial dessas jogadoras. Corrigir a postura em campo e manter os níveis de concentração e intensidade lá na estratosfera é fundamental para sair vitorioso de qualquer competição. Essa é a grande tarefa de Pia Sundhage e de todas as jogadoras brasileiras.