Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira destaca as escolhas de Juan Vojvoda e Marcelo Gallardo e a festa da torcida na Arena Castelão
As manifestações na Arena Castelão tinham motivos bem justos. A começar pelo caso de racismo na partida entre Fortaleza e River Plate disputada na Argentina. A mensagem em inglês não deixava de ser uma cutucada na Dona Conmebol que adora “passar um paninho” em situações com essa. E também existia a necessidade de vencer o jogo dentro de casa para continuar com chances de classificação na Copa Libertadores da América. E cabe aqui um adendo importante. Futebol não é apenas aquilo que vemos em campo. Existe todo um contexto que influencia diretamente dentro das quatro linhas. E o Fortaleza soube como usar tudo isso a seu favor numa das suas melhores atuações coletivas na atual temporada. Sem exagero de nenhuma parte.
Para encarar o River Plate, Juan Vojvoda mandou a campo o que tinha de melhor à sua disposição. O seu costumeiro 3-4-1-2 foi mantido com Yago Pikachu e Lucas Crispim nas alas, Hércules e Felipe protegendo o trio de zagueiros, Lucas Lima na criação e Silvio Romero e Moisés se movimentando constantemente no ataque. Do outro lado, Marcelo Gallardo apostou num 4-3-3 que tinha o experiente Enzo Pérez na proteção da última linha (e qualificando a saída de bola), Enzo Fernández e De la Cruz aparecendo por dentro e os pontas Barco e Pochettino procurando o excelente Julián Álvarez no comando de ataque e abrindo o corredor para as descidas de Marcelo Herrera e Casco pelos lados do campo. Tudo para criar superioridade numérica na frente.
O Fortaleza abriu o placar logo aos quatro minutos do primeiro tempo em jogada que começou no campo de defesa, passou por quase todos os jogadores e terminou na ótima trama entre Lucas Lima, Lucas Crispim e Silvio Romero. No entanto, a penalidade tola cometida por Marcelo Benevenuto permitiu que Enzo Fernández igualasse o marcador pouco tempo depois. Mesmo assim, o time de Juan Vojvoda não se intimidou com o forte adversário. O seu 3-4-1-2 se transformava num 5-3-2 sem a bola. Até encontrar o encaixe perfeito na marcação, o Leão do Pici sofreu um pouco com a movimentação constante e igualmente intensa do trio ofensivo do River Plate. A estratégia de dar liberdade para Casco e Marcelo Herrera funcionava na medida em que o ataque soltava a bola rápido. Mesmo assim, Tinga e Titi estiveram impecáveis na cobertura.
O grande mérito dos comandados de Juan Vojvoda foi não se deixar abalar pelo gol de empate e seguir com o plano. O Fortaleza aplicava uma forte marcação no meio-campo e buscava retomar a posse da bola para acionar Moisés e Silvio Romero nos contra-ataques em altíssima velocidade para explorar os espaços que a última linha do River Plate deixava às suas costas. Mesmo quando Barco e Pochettino recuavam para fechar os lados do campo sempre que Yago Pikachu e Lucas Crispim apareciam pelo setor. Lucas Lima, por sua vez, também teve participação importante ao dar opção de passe e abrir espaços que os volantes Felipe e Hércules aproveitaram bastante. Faltou vencer o goleiro Armani (o melhor em campo disparado) e acertar a pontaria. Mesmo assim, a atuação coletiva do Leão do Pici foi uma das melhores da atual temporada.
Difícil não perceber que o Fortaleza sentiu um pouco a intensidade e a exigência física do jogo no segundo tempo. Nesse ponto, não é difícil entender a reclamação de alguns torcedores sobre a demora de Juan Vojvoda para realizar as substituições necessárias. E o que vimos depois das entradas de Robson, Depietri, José Welison, Juninho Capixaba e Renato Kayzer foi um Leão do Pici intenso e que conseguiu travar as saídas de um River Plate igualmente desgastado e que já se dava por satisfeito com o empate fora de seus domínios. O 3-4-1-2 do primeiro tempo deu lugar a um ofensivo e (quase) insano 3-4-3 com força pelos lados do campo, profundidade e muita pressão no portador da bola. A lamentar somente a arbitragem ruim de Andrés Matonte. O uruguaio ignorou penalidade clara em cima de Renato Kayzer no segundo tempo.
O resultado final não diminui em nada a atuação coletiva do Fortaleza. A noite desta quinta-feira (5) nos apresentou uma equipe intensa, concentrada e que lembrou alguns dos seus melhores momentos com Juan Vojvoda. Com um ano no comando da equipe, o treinador argentino conseguiu igualar os duelos, bater de frente com o sempre temido River Plate de Marcelo Gallardo e fazer o ótimo goleiro Armani trabalhar muito mais do que o esperado. Isso porque o Leão do Pici jogou como ainda não havia jogado em 2022 e soube como utilizar a força que vinha das arquibancadas dentro de campo. Destaque para as ótimas apresentações de Tinga (o melhor do Fortaleza na humilde opinião deste que escreve), Silvio Romero, Hércules, Lucas Crispim, Lucas Lima e Titi. E a grande verdade é que a equipe de Vojvoda merecia a vitória.
É bom que se diga também que o Fortaleza ainda está bem vivo na Libertadores. O empate entre Alianza Lima e Colo-Colo permite que o Leão do Pici sonhe com a classificação para as oitavas de final da competição internacional. No entanto, para que esse objetivo seja alcançado, é preciso que o time de Juan Vojvoda não cometa os mesmos erros das primeiras rodadas e mostre a mesma intensidade do empate com o River Plate. Essa jornada incrível e inspiradora precisa continuar.