Vitória sobre o Colo-Colo é mais um belo capítulo da incrível jornada do Fortaleza na Libertadores
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa as escolhas de Juan Vojvoda para a partida decisiva desta quarta-feira (25) em Santiago
O futebol é maravilhoso. Todo mundo sabe disso. Até quem não gosta. É difícil encontrar esporte que produza tantas histórias incríveis e mexa tanto com as nossas paixões justamente por causa dessa capacidade de mexer com o nosso imaginário. A jornada do Fortaleza de Juan Vojvoda na Libertadores é um bom exemplo disso. Logo na sua primeira participação na competição mais importante do continente, o Leão do Pici conseguiu se garantir nas oitavas de final de maneira heroica e contra todos os prognósticos. A vitória sobre o tradicional Colo-Colo comprovou a força do time de Juan Vojvoda e nos apresentou uma equipe muito organizada, intensa e vibrante. Foram sete pontos conquistados em nove disputados com direito a dois triunfos fora de casa e um empate contra o poderoso River Plate. Histórico.
Quem viu o Fortaleza na primeira parte da fase de grupos pode até ter pensado que a falta de “casca” em competições internacionais pode ter pesado na derrota em casa para o mesmo Colo-Colo. Afinal de contas, o grupo F da Libertadores contava com clubes de muito mais tradição na América do Sul do que o Leão do Pici. Mas é justamente por isso que a recuperação do time comandado por Juan Pablo Vojvoda merece ser celebrada e exaltada. O cenário que se desenhava era completamente desfavorável e exigia dos jogadores um nível bastante elevado de força mental e intensidade para superar seus adversários e carimbar a vaga nas oitavas de final. E o Fortaleza conseguiu. Como bem fala sua torcida, “o Leão rugiu alto”.
Falando da partida desta quarta-feira (25), Juan Vojvoda sabia que a vitória sobre o Alianza Lima deixava o contexto favorável ao Fortaleza e apostou no seu 3-4-1-2 costumeiro com marcação encaixada, contenção dos espaços na frente da área do goleiro Marcelo Boeck e muita intensidade na pressão pós-perda. O gol marcado por Silvio Romero (logo aos três minutos de partida) deixava o cenário ainda mais propício para que o Leão do Pici pudesse controlar as ações em campo e jogar de maneira mais confortável. Do outro lado, o técnico Gustavo Quinteros mandava o Colo-Colo a campo num 4-2-3-1 espaçado e que tinha em Leonardo Gil (AQUELE MESMO que jogou no Vasco não tem muito tempo) como o “camisa 10” da sua equipe.
O Fortaleza esteve sempre organizado e muito concentrado em cada espaço que aparecia no campo de ataque. O segundo gol do Leão do Pici (marcado por Moisés) é um ótimo exemplo. Juan Vojvoda sabia que o Colo-Colo marcava a saída de bola da sua equipe num 4-1-3-2 com o volante César Fuentes saltando para a pressão e se alinhando com Pablo Solari e Gabriel Costa para fechar espaços e bloquear as linhas de passe da equipe cearense. Com Hércules e Felipe muito ligados na movimentação dos companheiros de equipe, o Fortaleza conseguia vencer essa pressão com certa facilidade e acionar o ataque. Lucas Lima, Moisés e Silvio Romero, por sua vez, arrastavam a marcação e ganhavam sempre a companhia de um dos alas (Lucas Crispim ou Yago Pikachu). Com superioridade numérica, as jogadas fluíam com mais facilidade.
Em organização defensiva, Juan Vojvoda lançou mão de mais um artifício para gerar superioridade numérica no setor onde está a bola e ganhar ainda mais velocidade nos contra-ataques. Depois de começar com uma linha de cinco na defesa, o Fortaleza passou a jogar com Yago Pikachu saltando para pressionar o portador da bola e fechando como meia pelo lado direito. Com isso, Lucas Crispim recuava quase como um lateral e fechava a última linha. O Colo-Colo encontrou muitas dificuldades para entrar na área do goleiro Marcelo Boeck e só conseguiu levar perigo nos chutes de longa distância e nos poucos momentos em que o Fortaleza diminuía o ritmo. Exatamente como aconteceu no gol de honra do escrete de Gustavo Quinteros. Infelicidade de Ceballos no lance e cochilo de todo o sistema defensivo do Leão do Pici.
O segundo tempo no Monumental de Santiago começou com a (justa) expulsão de Jeyson Rojas e o terceiro gol do Fortaleza (o segundo de Moisés) em contra-ataque puxado pelo próprio camisa 21. Poucos minutos depois, Yago Pikachu recebeu de Silvio Romero e tocou na saída do goleiro Brayan Cortés. No entanto, todos aqueles que pensavam que o escrete comandado por Juan Vojvoda teria um pouco de paz viram a reação do Colo-Colo com mais um gol contra de Ceballos (aos 18 minutos do segundo tempo). Mesmo com os descansados Juninho Capixaba, Matheus Jussa, Robson, Depietri e José Welison em campo, o Fortaleza viu seu adversário assustar mais uma vez com Leonardo Gil aproveitando novo cochilo do sistema defensivo. Por mais que o time passasse por sufocos desnecessários, a classificação já estava garantida.
Encarado como o “estranho no ninho” num grupo que tinha equipes de muito mais tradição e história na Copa Libertadores da América, o Fortaleza soube todas as suas armas para mostrar a todos que o futebol nordestino tem qualidade e merece seu lugar ao sol. O trabalho feito no clube já produz frutos generosos há algum tempo e a classificação num grupo extremamente complicado só comprova essa tese. Juan Pablo Vojvoda pode não ser o melhor treinador do mundo, mas sabe muito bem o que deve ser feito em campo e como potencializar o talento de jogadores “renegados” por clubes do Rio de Janeiro e de São Paulo. Yago Pikachu, Tinga, Titi, Lucas Lima e vários outros nomes chegaram ao Leão do Pici e se encaixaram como uma luva no esquema tático do treinador argentino. O trabalho é fenomenal e merece aplausos.
Mas nenhum jogador merece ser mais celebrado do que o atacante Moisés. Depois de ser criticado por ter escolhido o caminho do Fair Play no jogo contra o Fluminense, o camisa 21 teve o gesto premiado com dois gols e o prêmio de melhor jogador da partida desta quarta-feira. Por mais que nosso mundo ainda esteja recheado de gente mesquinha, cruel e sem escrúpulos, Moisés nos mostrou que ainda vale muito a pena ser honesto. Mesmo no ambiente completamente tóxico do futebol.