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As ideias táticas de Paulo Sousa (PARTE I) – A experiência vitoriosa como jogador da Juventus e do Borussia Dortmund

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira destaca as influências de Marcelo Lippi e Ottmar Hitzfeld no trabalho do novo treinador do Flamengo

Por Luiz Ferreira em 10/01/2022 18:46 - Atualizado há 3 anos

Alexandre Vidal / Flamengo

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira destaca as influências de Marcelo Lippi e Ottmar Hitzfeld no trabalho do novo treinador do Flamengo

A expectativa em torno do trabalho de Paulo Sousa é gigantesca. E não poderia ser diferente. Ainda mais diante da sempre presente “sombra” de Jorge Jesus ainda bastante presente no imaginário do torcedor do Flamengo e de todo o potencial que o elenco rubro-negro. Desde o acerto com o clube da Gávea no final de 2021 até a sua apresentação oficial nesta segunda-feira (10), muito se falou sobre as suas ideias táticas, seus conceitos e a forma como gosta de montar suas equipes. No entanto, pouco se falou sobre a sua carreira como jogador e sobre a maneira como a convivência com nomes vitoriosos do futebol mundial influenciaram e influenciam seus trabalhos. Nessa reportagem especial dividida em duas partes, este que escreve vai trazer um pouco do impacto que Marcelo Lippi e Ottmar Hitzfeld tiveram na carreira de Paulo Sousa.

O novo técnico do Flamengo surgiu para o futebol no Benfica em 1989 e logo dividia as atenções do torcedor encarnado com nomes do porte de Paulo Futre, Rui Costa e o brasileiro Mozer (antigo ídolo do Fla). Nesse mesmo ano, Paulo Sousa conquistou a Copa do Mundo Sub-20 com a Seleção Portuguesa então comandada por Carlos Queiroz junto com João Pinto, Fernando Couto, António Folha, Jorge Couto e vários outros nomes que tiveram relativo sucesso no futebol lusitano. Acabou se transferindo para o Sporting em 1993 após conquistar um título português e uma Taça de Portugal com o Benfica. Mas já chamava a atenção da imprensa esportiva com suas atuações seguras e marcadas pela boa técnica com e sem a bola e pela visão de jogo apurada. Em 1994, Paulo Sousa acertou sua transferência para a Juventus de Turim. E é aí que a nossa história começa de fato.

O início na “Vecchia Signora” não foi marcado por grandes problemas de adaptação ao novo país e ao estilo de jogo na Itália. Antes de se firmar como titular de um elenco estrelado, Paulo Sousa participava de um rodízio entre Antonio Conte, Angelo Di Livio, Didier Deschamps, Alessio Tacchinardi e Giancarlo Marocchi na equipe comandada por Marcelo Lippi (que viria a ser campeão da Copa do Mundo de 2006 com a Squadra Azzurra). Em artigo publicado no EXCELENTE The Coaches’ Voice, Paulo Sousa relatou a forma como assimilava as orientações dos treinadores.

Eu gostava de ter meu próprio espaço, onde podia visualizar toda a informação que os treinadores me passavam. Tentei gastar o tempo mentalizando que teria um bom rendimento. No ônibus, a caminho do estádio, meu foco estava em visualizar os rivais que enfrentaria em minha faixa de campo. Para tomar as melhores decisões, o mais rápido possível.

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Paulo Sousa conquistou um Campeonato Italiano, uma Copa da Itália (ambas em 1994/95), uma Supercopa da Itália (em 1995) e a Liga dos Campeões da UEFA em 1995/96 após vencer o Ajax de Louis van Gaal (o campeão da edição anterior da Champions League) na decisão por pênaltis. O português afirmou ao The Coaches’ Voice que cresceu muito no âmbito tático após todo o convívio com Marcelo Lippi na Juventus.

Marcelo (Lippi) era um grande comunicador. A Itália foi o meu primeiro passo, depois de sair de Portugal, para entender o jogo do ponto de vista tático. Eu era um jovem muito tímido quando cheguei. Não tinha o costume de dividir meus pensamentos, mas Marcelo me estimulou a ser mais comunicativo. Ele queria saber a minha opinião sobre os treinos, jogos, adversários e sobre nós mesmos. Eu mudei muito como pessoa. Ele me fez pensar mais e mais sobre o jogo, o que me ajudou a crescer, a analisar e reconhecer coisas. E, consequentemente, tomar decisões mais rapidamente em campo. Assim, a execução técnica de meus movimentos também evoluiu. A maneira que ele trabalhava a parte tática nos treinamentos, diariamente, era algo totalmente diferente. Era maravilhoso. Sua preparação para as partidas – nosso modelo de jogo, e como detalhava as estratégias para embaralhar, pressionar e se antecipar ao rival – me ajudou muito a interpretar melhor o jogo.

O próprio Paulo Sousa falou ao canal do The Coaches’ Voice no YouTube sobre aquela Juventus histórica e sobre o fortíssimo 4-3-3 montado por Marcelo Lippi em novembro de 2021. O vídeo está em inglês, mas é possível habilitar as legendas em português na própria plataforma.

Apesar do sucesso no futebol italiano, Paulo Sousa sofreu com problemas no joelho e, apesar do carinho que tinha pela Juventus e pela torcida bianconera, acabou negociado com o Borussia Dortmund em 1996. O ambiente e a recuperação da lesão permitiram que o português pudesse jogar seu melhor futebol segundo o próprio afirmou ao The Coaches’ Voice.

A dor no joelho foi um incômodo constante e eu necessitava de tratamentos agressivos para poder treinar e jogar. Portanto, tomei a decisão de me transferir a outro clube. Tive a oportunidade de ir à Inglaterra, ao Arsenal, mas preferi assinar com o Borussia Dortmund. Eu havia jogado contra eles pela Juventus na Champions League. E admirava seu estilo de jogo, sabia que eu poderia me encaixar bem naquele elenco. Acreditava, de fato, que podíamos alcançar algo especial. Quando fui apresentado à imprensa, falei: ‘Vim para ganhar a Champions League’. Eu realmente acreditava que era possível. Eu precisava ser operado e me recuperar. Mas isso me ajudou a ter uma recuperação mais rápida. Foi lá que joguei meu melhor futebol.

Paulo Sousa foi campeão da Supercopa da Alemanha em 1996, da Liga dos Campeões da UEFA em 1996/97 e do Mundial Interclubes em 1996 (na vitória do Borussia Dortumund sobre o Cruzeiro por dois a zero). E é aqui que destacamos outra grande influência no futebol e na formação do português como treinador: o alemão Ottmar Hitzfeld.

Todo o contexto acabou sendo muito favorável para que Paulo Sousa apresentasse a sua “melhor versão” como volante construtor num 3-4-1-2 que até hoje é lembrado pela fanática torcida do Borussia Dortmund. A equipe contava com nomes como o zagueiro Jürgen Kohler, o líbero Matthias Sammer (um dos melhores da sua geração), o brasileiro Júlio César e o seguro Martin Kree como opções para zaga. No meio-campo, Paulo Sousa tinha o escocês Paul Lambert (que também viria a se tornar treinador), jogador de muita intensidade até mesmo para aqueles tempos. Mais à frente, Andreas Möller ocupava bem o espaço entre as linhas adversárias e armava as jogadas para o oportunismo de Karl-Heinz Riedle (autor de dois gols na final da Champions League contra a Juventus) e o suíço Stéphane Chapuisat. Ao The Coaches’ Voice, Paulo Sousa também não poupou elogios ao técnico Ottmar Hitzfeld.

Nosso técnico, Ottmar Hitzfeld, tinha muita intuição na hora de fazer as substituições. E também interagia de uma forma bem peculiar com os jogadores, no que diz respeito às decisões e estratégias de jogo. Ele nunca abriu mão de sua liderança, mas tinha capacidade de interagir com os atletas e nos gerar uma maior responsabilidade na hora de desenvolver o plano de jogo.

É interessante notar que a formação daquele Borussia Dortmund pode ser vista em vários dos trabalhos de Paulo Sousa depois de sua passagem pelo clube alemão. É a prova de que o convívio ainda que curto com a lenda Ottmar Hitzfeld foi extremamente proveitoso no que se refere à leitura de jogo e na interação com os jogadores para potencializar o talento de cada um deles de maneira mais rápida e eficiente dentro das quatro linhas.

Formação do Borussia Dortmund na vitória sobre a Juventus na final da Liga dos Campeões da UEFA de 1996/97.

Se Paulo Sousa entendeu como se preparar para um jogo e a detalhar as estratégias para superar um adversário com Marcelo Lippi, Ottmar Hitzfeld foi importantíssimo no convívio e na parte intuitiva da compreensão do que acontece dentro de campo. As campanhas dos dois títulos consecutivos da Liga dos Campeões da UEFA em 1995/96 (com a Juventus) e em 1996/97 (com o Borussia Dortmund) foram determinantes no processo da formação do TREINADOR Paulo Sousa. E fato é que as coisas funcionam assim com todo jogador que resolve “migrar” para o banco de reservas. Zagallo tentou encontrar um jogador que fizesse sua função em campo quando foi treinador da Seleção Brasileira. Guardiola é claramente influenciado por Cruyff e Rinus Michels. Do mesmo modo que Ernst Happel, Carlo Ancelotti, Paulo Autuori, Abel Braga, Rubens Minelli e vários outros influenciaram gerações de técnicos no Brasil e no mundo.

A maneira como Paulo Sousa arma suas equipes e as possibilidades táticas que o elenco do Flamengo pode dar ao treinador português serão tema da segunda parte dessa reportagem especial. Diante de tudo o que já foi dito e repetido sobre o novo comandante do Mais Querido do Brasil, é plenamente possível crer que o time terá caras novas e algumas mudanças mais profundas a médio e a longo prazo. Ainda mais diante desse nosso calendário insano.

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