Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa a atuação do Camaleão contra o Campinense e as escolhas de Thiago Carvalho e Ranielle Ribeiro
O primeiro campeão nacional de 2021 não poderia ter sido outra equipe senão aquela que melhor entendeu o contexto da competição que disputava e a que melhor executou o (ótimo) planejamento da sua comissão técnica. Ataque envolvente, meio-campo criativo e defesa sólida. Boa campanha dentro e fora de casa e imposição do seu estilo de jogo mesmo nas situações mais complicadas. É por conta desses e de vários outros motivos que a Aparecidense merece demais o título do Brasileirão da Série D. Não se trata apenas de olhar o resultado final da partida deste sábado (13) no simpático Estádio Aníbal de Toledo. A maneira como o escrete comandado por Thiago Carvalho travou as saídas do Campinense no jogo de ida e a concentração da equipe na partida de volta, desde o momento em que a Raposa abriu o placar até a construção do gol de empate (e do título), falam por si só. O Camaleão mostrou que é possível sim encontrar futebol de alto nível fora dos grandes centros do país. O título da Série D está em ótimas mãos.
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Mas é preciso dizer que o Campinense vendeu caro a conquista inédita do escrete de Aparecida de Goiânia e que o duelo tático travado pelos dois treinadores foi marcado pelo altíssimo nível técnico e pelas ótimas ideias dos dois treinadores. Precisando da vitória simples para levar o confronto para a decisão por pênaltis, Ranielle Ribeiro mandou a campo o que tinha de melhor, mas com uma pequena alteração na formação da Raposa. O 4-2-3-1 básico foi mantido, mas era bastante comum ver Serginho Paulista saindo no encalço de Rodriguinho e Bruno Henrique e surgindo na intermediária quase como um quarto jogador de meio-campo (na variação para o mesmo 4-1-4-1 da Aparecidense). Thiago Carvalho, por sua vez, não fez grandes mudanças táticas na sua equipe. Seu 4-3-3 foi mantido (com Alex Henrique no lugar do lesionado Gilvan) e uma postura mais cautelosa e um pouco mais pragmática do que na partida disputada em Campina Grande. Tudo para quebrar o ritmo e aproveitar os espaços para contra-atacar.
A Aparecidense iniciou a partida cadenciando mais o jogo e explorando bastante o espaço às costas dos laterais do Campinense com Rafa Marcos e Robert (um dos melhores em campo) se movimentando bastante e saindo do lado para dentro procurando Alex Henrique no comando de ataque e/ou as chegadas de David e Rodriguinho. Quanto mais o tempo passava, melhor para o Camaleão e sua torcida no Estádio Aníbal de Toledo. Diante desse cenário, ver o Campinense se lançando na direção do campo ofensivo (ainda que de maneira um pouco desorganizada em determinados momentos) não era nenhuma surpresa. Ranielle Ribeiro apostava bastante nas subidas de Felipe e Filipe Ramon ao ataque. Principalmente do camisa 2 da Raposa, uma das principais válvulas de escape do time paraibano. Com Serginho Paulista aparecendo constantemente no terço final, Anselmo fazendo bem o pivô e Fábio Lima muito bem nas jogadas de ultrapassagem, o Campinense foi empurrando a Aparecidense para trás e ganhando bastante terreno.
A postura mais agressiva deu resultado aos nove minutos da segunda etapa, quando o Campinense abriu o placar depois que Dione completou cruzamento de Fabio Lima para as redes do ótimo Pedro Henrique. Thiago Carvalho (que já havia mandado Adriel e Negueba para o jogo e sacado Rafa Marcos e Rafael Cruz logo depois do intervalo) e viu a sua Aparecidense parar no goleiro Mauro Iguatu em duas ótimas oportunidades. O Camaleão ocupava mais o campo ofensivo, mas mantinha a organização na troca de passes sem perder a cabeça ou o controle dos nervos diante da necessidade de se igualar o marcador para recuperar a vantagem no confronto. Aos 32 minutos, Robert se livrou da marcação e viu Samuel (que havia entrado no lugar de David não fazia muito tempo) atacando o espaço deixado pelos avanços constantes de Felipinho ao ataque. O passe foi certeiro, no único espaço possível para o camisa 19 dominar, entrar na área e tocar por cima de Mauro Iguatu. Golaço de uma equipe que sabia o que fazer e quando fazer.
O que se viu no Estádio Aníbal Toledo após o gol marcado por Samuel foi uma Aparecidense que se fechou na defesa e que apenas esperou o Campinense para tentar encaixar o contra-ataque que mataria o confronto. Na prática, o escrete de Ranielle Ribeiro levava mais perigo na base das bolas levantadas na área do que através de alguma jogada mais trabalhada pelo seu sistema ofensivo. A única chance real de gol foi uma cabeçada de Cláudio que parou no travessão. Isso porque a Aparecidense tirava todo o campo de ação da Raposa e coordenava bem seus movimentos no campo de defesa. Tudo para guardar a entrada da área, bloquear as linhas de passe e conter o ímpeto final do seu adversário nos minutos finais que separavam a equipe de Aparecida de Goiânia do inédito título do Brasileirão da Série D. E nesse sentido, o escrete de Thiago Carvalho teve concentração suficiente para não se deixar levar pelo clima de “já ganhou” e manter o foco nos minutos finais de uma decisão que já entrou para a história.
Quem acompanhou a trajetória da Aparecidense (como este colunista) sabe muito bem que o título da Série D está em ótimas mãos. Em 24 jogos na competição nacional, o Camaleão venceu treze, empatou sete e sofreu apenas quatro derrotas (o que dá um aproveitamento de 63,8 por cento). Foram 31 gols marcados e apenas 15 sofridos. Números que evidenciam a qualidade do trabalho realizado na equipe dentro e fora de campo. Podemos até afirmar que a Aparecidense não é uma equipe muito ofensiva e que privilegia mais o trabalho defensivo. Mas precisamos reconhecer que é muito difícil fazer gols nela dada a organização defensiva e um estilo de jogo que começa com uma pressão pós-perda extremamente eficiente, jogadores altamente comprometidos com a proposta de Thiago Carvalho e muita seriedade dentro e fora de campo. Ao mesmo tempo, é preciso levar em consideração a continuidade do trabalho e o respaldo da diretoria com um projeto que se mostrou altamente eficiente e vencedor.
A conquista do Campeonato Brasileiro da Série D pelo Camaleão é a maior prova de que bons trabalhos geram bons frutos no futebol de alto rendimento. E por mais que a competição seja diminuída e até mesmo ridicularizada por alguns mais exaltados, precisamos entender e aceitar que o nível técnico está aumentando cada vez mais. Aparecidense, Campinense, ABC e Atlético Cearense mostraram isso com apresentações consistentes e propostas de jogo bem sólidas. E o primeiro campeão nacional de 2021 não poderia estar em melhores mãos.
https://www.youtube.com/watch?v=Xc2kUAhxi_M
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