Retornos, ausências e testes: alguns pitacos honestos sobre a convocação da Seleção Brasileira
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa a volta de Philippe Coutinho, a ausência de Vinícius Júnior da lista de convocados e as demais escolhas de Tite
Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa a volta de Philippe Coutinho, a ausência de Vinícius Júnior da lista de convocados e as demais escolhas de Tite
Há muita coisa a ser falada sobre a lista de convocados da Seleção Brasileira divulgada nesta sexta-feira (29) na sede da CBF. Retornos, ausências e oportunidades para a realização de testes no escrete canarinho foram alguns dos assuntos mais abordados com Tite na entrevista coletiva, além da “corneta” de sempre por parte de torcedores e jornalistas (que também são torcedores, não se esqueça disso) que tomou conta dos principais programas esportivos durante todo o dia. Dentro disso tudo, as análises giravam em torno de dois assuntos específicos: o retorno de Philippe Coutinho depois de um longo e tenebroso inverso e a ausência de um Vinícius Júnior em ótima fase no Real Madrid da lista de convocados. Havia quem falasse em “absurdo”, em “panela na Seleção Brasileira” e em outros termos impublicáveis aqui no TORCEDORES.COM e em vários outros sites. Este que escreve, no entanto, prefere tentar entender o que se passou na cabeça do técnico da Seleção Brasileira apesar de discordar dele em vários pontos.
Vale lembrar que Tite chamou apenas jogadores que atuam no exterior (com a exceção de Gabriel Chapecó, goleiro do Grêmio) para as partidas contra Colômbia (dia 11 de novembro, em São Paulo) e Argentina (dia 16 de novembro, em San Juan), válidas pelas Eliminatórias da Copa do Mundo. Com 31 pontos ganhos, a Seleção Brasileira está praticamente garantida na Copa do Mundo do Catar e, por isso, as últimas partidas da competição devem ser utilizadas para a observação e testes no escrete canarinho. Dito isto, também se faz necessário entender como Tite recuperou o bom futebol da sua equipe tomando como inspiração a formação usada em 2016 e 2017. Na ocasião, Neymar jogava mais aberto pela esquerda com liberdade para chegar no ataque, Gabriel Jesus ficava um pouco mais à frente e Philippe Coutinho exercia a função de ponta-armador pela direita. Um 4-1-4-1/4-3-3 em que a movimentação do meia do Barcelona, dos laterais vindo mais por dentro e de Renato Augusto faziam com que a Seleção Brasileira se organizasse num 4-2-3-1 em alguns momentos.
Tite sempre deixou clara a sua admiração pelo futebol de Philippe Coutinho e por tudo o que ele já entregou sob seu comando. O melhor jogador brasileiro da Copa do Mundo da Rússia não disputava um jogo pela Seleção Brasileira desde o dia 13 de outubro de 2020, na vitória por 4 a 2 sobre o Peru. A sua convocação é perfeitamente discutível, porém não é nada absurda como alguns colocaram. Espera-se que Tite resgate o bom futebol dele e de vários outros jogadores na oportunidade que surgiu. Ao mesmo tempo, é perfeitamente normal que treinadores tenham seus jogadores de confiança. Foi assim com Zinho, Dunga e Paulo Sérgio com Carlos Alberto Parreira em 1994, com Roque Júnior, Kleberson e Marcos com Felipão em 2002 e com Renato Augusto e Paulinho com o próprio Tite em 2018. Além disso, já se sabe que Philippe Coutinho é talvez um dos grandes protagonistas da Seleção Brasileira há pelo menos quatro temporadas e um dos destaques da equipe no Mundial da Rússia. Pode-se discutir sua presença na lista. Não sua qualidade.
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Também é necessário desfazer uma das falácias mais repetidas nas redes sociais nessas últimas horas. Philippe Coutinho NÃO FOI CONVOCADO no lugar de Vinícius Júnior. Mas não mesmo. Acreditar isso é o mesmo que acreditar que cloroquina é eficaz contra a COVID-19. Além disso, quem repete isso mostra que não faz a menor ideia de como a Seleção Brasileira se comporta em campo e o que influenciou as escolhas de Tite. Neymar deixou de ser o ponta agudo pela esquerda para se transformar no principal articulador do escrete canarinho jogando mais por dentro. E quem exerce a função que era de Philippe Coutinho hoje é Lucas Paquetá. Mesmo assim, é preciso entender que os dois possuem características diferentes. O primeiro tende a se lançar mais na área adversária e mostrou certa dificuldade para atuar mais recuado. Já o meia do Lyon vem se adaptando bem à função e até jogando com certa desenvoltura como volante ao lado de Casemiro. Philippe Coutinho foi chamado justamente para ser mais uma opção de criatividade na Seleção Brasileira.
Já Vinícius Júnior ficou de fora da lista de convocados por opção de Tite que vê Raphinha e Antony num patamar acima do atacante do Real Madrid. Ao mesmo tempo, teve poucos minutos na Seleção Brasileira e sempre entrou “na fogueira”, num contexto que não muito favorável às suas características. E como dito anteriormente, a equipe comandada por Tite joga com um ponta articulador pela esquerda (Lucas Paquetá) e outro mais agudo pela direita (Raphinha). Esse complemento de características tem sido uma marca da Seleção Brasileira há pelo menos cinco temporadas. Além disso, a zona do campo onde Vinícius Júnior se sente mais confortável está ocupada. E com as boas atuações de Raphinha e Antony contra Venezuela, Colômbia e Uruguai, é possível que o jogador do Real Madrid tenha ficado para trás na disputa por uma vaga entre os 23 convocados. E a boa atuação contra a Celeste Olímpica deixou em Tite a certeza de que o caminho é apostar na formação que deu certo nas Eliminatórias para a Copa da Rússia mais uma vez.
Pode ser que Tite não enxergue em Vinícius Júnior o comprometimento necessário para jogar sem a bola. Com Zinedine Zidane, o camisa 20 do Real Madrid tinha que recompor mais pelo lado e voltar mais para ajudar a marcação. Só que Carlo Ancelotti percebeu que o brasileiro rende muito mais jogando próximo de Benzema puxando os contra-ataques e sem tantas obrigações defensivas. Vinícius Júnior até volta um pouco, mas não tanto. No clássico contra o Barcelona, por exemplo, era bastante comum ver o lateral Mendy jogando um pouco mais à frente e o alemão Toni Kroos se posicionando um pouco mais pelo lado esquerdo para “compensar” a marcação e deixar o jovem brasileiro mais solto. Voltando para o contexto da Seleção Brasileira, Vinícius Júnior teria que circular mais pelo campo na formação escolhida por Tite na sua equipe. Muito mais do que vem fazendo com Carlo Ancelotti. Isso o coloca um pouco abaixo de Antony, jogador que mostrou bastante desenvoltura para jogar circulando, tocando e se projetando no espaço vazio.
Mesmo compreendendo as escolhas de Tite e tudo que o levou a elaborar essa lista de convocados, este que escreve teria chamado Vinícius Júnior por conta da ótima fase no Real Madrid e o colocado num contexto mais favorável. Talvez pelo lado direito mesmo, onde teria mais espaço do que no setor onde se sente mais confortável. Do mesmo modo que Bruno Guimarães seria o escolhido por este colunista. E não Gerson. Seja como for, por mais que se discorde ou não do treinador do escrete canarinho, existe sim uma linha de pensamento bem clara sendo colocada em prática na Seleção Brasileira. E compreender o que se passa na cabeça de Tite e os motivos que o levam a escolher este ou aquele jogador menos preferido pela “massa” é fundamental para ter argumentos mais sólidos para discordar de suas escolhas. Exatamente como acontece aqui neste parágrafo. Por outro lado, é preciso entender que apenas 23 nomes serão chamados para a disputa da Copa do Mundo. Ou seja, não há como levar muita gente. Há um limite e muita gente boa vai ficar de fora.
Vida de treinador não é fácil. Ainda mais da Seleção Brasileira. Sempre há um “corneta” mais barulhento que vai exigir este ou aquele jogador em detrimento de outro. Mesmo assim, este que escreve segue discordando de Tite apesar de entender os motivos pelos quais Philippe Coutinho foi convocado e Vinícius Júnior não. Ainda mais num momento em que os testes podem (e devem) ser realizados. Só que compreender a linha de pensamento do técnico da Seleção Brasileira é importantíssimo até para que eu e você saibamos o que, como e quando cobrar dele.
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