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Recuperar a credibilidade e “trocar o pneu com o carro andando”: os desafios de Abel Braga no Internacional

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa o retorno do treinador campeão mundial em 2006 ao Colorado Gaúcho

Por Luiz Ferreira em 16/11/2020 14:32 - Atualizado há 4 anos

Ricardo Duarte / SC Internacional

Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa o retorno do treinador campeão mundial em 2006 ao Colorado Gaúcho

Este que escreve não apostaria em Abel Braga para ser assumir o comando do Internacional após a saída conturbada (e até agora muito mal explicada) do argentino Eduardo Coudet para o Celta de Vigo. Primeiro por conta dos trabalhos ruins do veterano treinador no Flamengo, no Cruzeiro e no Vasco. E depois pela própria característica de seu antecessor. Abelão pensa suas equipes de maneira completamente diferente de Coudet e a falta de tempo para treinar pode sim prejudicar o elenco colorado na briga pelos títulos da Copa do Brasil, da Libertadores e do Brasileirão. É exatamente por isso que não é exagero nenhum afirmar que Abel Braga tem dois grandes desafios no comando do Internacional: recuperar a credibilidade em torno do seu trabalho como treinador e tornar a sua equipe competitiva novamente com uma maratona imensa de jogos decisivos pela frente.

Difícil não perceber que o retorno de Abelão está diretamente ligado às lembranças afetivas da conquista da Libertadores e do Mundial de Clubes em 2006. Aquele Internacional que superou o Barcelona de Ronaldinho Gaúcho, Iniesta e Deco marcava forte e saía em alta velocidade para os contra-ataques variando de um 3-4-1-2 para um 4-3-1-2 conforme a movimentação do volante Edinho no meio-campo. O contexto daqueles tempos permitia que o escrete colorado cozinhasse a partida e utilizasse a estratégia de Abel Braga na decisão em Yokohama. O contexto de 2020, no entanto, é bem diferente daquele de 14 anos atrás. O futebol dos nossos tempos atuais é muito mais físico e intenso do que na década passado. Ao mesmo tempo, mesmo os treinadores mais boleiros perceberam que é preciso se manter atualizado e estudar muito para não ser taxado de ultrapassado.

Eduardo Coudet tinha esse perfil mais estudioso e mais “moderno”. Já Abel Braga traz consigo a alcunha de técnico vitorioso que “parou no tempo”. Notar essa diferença no trato e no trabalho dos dois treinadores é vital para que se possa compreender bem todo o contexto do Internacional hoje. Se o Colorado Gaúcho se organizava num 4-1-3-2 com forte marcação na saída de bola do adversário e com bastante consistência no meio-campo com Boschilia, Edenilson e Patrick se movimentando atrás da dupla de ataque com seu antigo comandante, as coisas mudaram um pouco com o veterano treinador. A começar pela formação escolhida: o 4-4-2/4-2-2-2. Sem contar com alguns de alguns dos jogadores citados acima, Abelão optou pela escalação de Marcos Guilherme e Maurício (ex-Cruzeiro) pelos lados e com Thiago Galhardo se movimentando bastante atras de Abel Hernández.

Abel Braga escalou o Internacional num 4-4-2/4-2-2-2 nas partidas contra o América-MG e o Santos e viu sua equipe encontrar muitas dificuldades para assimilar seus conceitos. O pouco tempo para treinar e as lesões de jogadores importantes complicaram ainda mais a vida do veterano treinador. Foto: Reprodução / Esporte Interativo

Vale ainda destacar que o Internacional de Abel Braga não teve compactação entre as suas linhas e sofreu com os erros de posicionamento do miolo de zaga (pontos que podem ser explicados pela mudança brusca no comando da equipe e que só podem ser corrigidos nos treinamentos). Ao mesmo tempo, o meio-campo e o ataque sofrem muito com as ausências de Patrick e Edenílson, as principais válvulas de escape do escrete colorado. Por outro lado, o Inter mostrou uma dinâmica interessante a partir da presença de Uendel mais por dentro e com Abel Hernández abrindo o jogo pela esquerda. Maurício (o “ponta-armador do 4-4-2 de Abel Braga) e Rodrigo Lindoso esperam a sobra e Rodinei sobe pela direita para criar superioridade numérica no campo ofensivo. Mesmo assim, ainda é muito pouco perto da intensidade que o Inter de Eduardo Coudet entregou ao longo do ano de 2020.

Uendel sai da lateral e vem armar o jogo por dentro. Abel Hernández cai pela esquerda e abre espaços para as chegadas de Thiago Galhardo e Marcos Guilherme. O Internacional de Abel Braga mostrou uma dinâmica interessante na criação das jogadas apesar do nível baixo de intensidade. Foto: Reprodução / Esporte Interativo

É preciso dizer que qualquer treinador do mundo encontraria as mesmas dificuldades que Abel Braga está encontrando no Internacional. No entanto, poucos no mundo encontrariam a resistência e a desconfiança que Abelão encontrou. Muito por conta da péssima qualidade dos seus últimos trabalhos no Cruzeiro e no Vasco e por ainda se agarrar a conceitos antigos e surrados que nada têm a ver com o futebol jogado hoje. Mesmo assim, é impossível não reconhecer que o “choque de conceitos” e a necessidade de se “trocar o pneu com o carro andando” prejudica qualquer trabalho em qualquer equipe desse mundo. Ainda mais no cada vez mais absurdo e insano calendário do nosso futebol que tira jogadores importantes dos clubes (como o atacante Thiago Galhardo) em momentos decisivos de competições importantes, como a Copa do Brasil e a Copa Libertadores da América.

Abel Braga (mais uma vez) terá que lidar com a desconfiança e com a falta de tempo para treinar e implementar seus conceitos num Internacional completamente esfacelado por lesões e desfalques de última hora. Só o tempo irá dizer se o escrete colorado vai recuperar a consistência de outros tempos ou se a chegada de Abelão só aconteceu mesmo por conta de lembranças afetivas de um passado vitorioso.

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