Liderança, um esporte feminino: a única técnica de luta greco-romana no Brasil
Com mais de 30 anos de história na luta greco-romana, Lucimar Medeiros é campeã contra o preconceito
Por Ludmilla Florencio, em São Paulo
Dos altos de seu 1,67 de altura, Lucimar Medeiros, 48, é uma gigante. Nascida em Belo Horizonte, veio para São Paulo ainda criança, e se tornou um dos grandes nomes da luta, no Brasil.
O primeiro contato com o esporte aconteceu ainda na infância. Apaixonou-se. Lutou muito – literalmente – até iniciar a carreira como judoca, mas dominou o cenário do Wrestling. Tornou-se a única técnica de luta greco-romana no Brasil. Além disso, guarda orgulhosamente o título de Campeã Brasileira, por 3 vezes, e Campeã do Circuito Sul Americano.
Em conversa com Papo de Mina, Lucimar contou um pouco de sua trajetória dentro do mundo esportivo.
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Primeiro passo no tatame
Com cerca de 10 anos de idade, já tinha outro objetivo traçado dentro do desporto. Ao lado de onde morava, seu vizinho e padrinho de sua irmã foi responsável por apresentar um outro universo: o da luta.
“Ele montou uma grande área de judô, para ensinar às crianças do bairro. Comecei a observar os treinos e isto acabou despertando o interesse em fazer parte. Foi amor à primeira vista”, comenta.
Apesar de todo sentimento desenvolvido por uma das modalidades mais antigas da arte marcial, precisou vencer uma pequena batalha antes: a proibição de sua mãe.
A orientação médica de que seria importante para o desenvolvimento da menina, fez a responsável por Lucimar ceder. A vitória abriu espaço para caminhar dentro da área esportiva que mudaria sua vida para sempre.
A caminhada árdua
Virou uma excelente atleta e, aos 15 anos de idade, já participava de competições em festivais. Conforme, na primeira luta oficial que fez, conquistou o bronze no Campeonato Paulista.
Com a conquista da maior idade, aos 18, começou a ter mais visibilidade e virou atleta da Seleção Olímpica de Judô. Lucimar não conseguiu chegar a ganhar medalhas, por não fazer parte da equipe principal.
“Me segurei com todas as forças para fazer o que eu estava amando fazer na época”. Isso foi o segredo para o desenvolvimento da lutadora, embora vivia dificuldades. Conheceu e disputou, praticamente, todas as modalidades.
A luta olímpica, o wrestling e a liderança
A convite do ex-presidente da Federação da Luta Olímpica, no ano 1999, passou a competir no desporto. Foi a principal atleta do país e iniciou sua trajetória no Centro Olímpico de Treinamento e Pesquisa, o COTP, no ano de 2002.
Em 2006, conseguiu uma bolsa de estudos para cursar educação física – um complemento ao que já desempenhava tão bem. Além dos treinamentos que praticava, foi voluntária na instituição por quatro anos – conciliando, por outro lado, o trabalho de professora de judô em colégios particulares da cidade de São Paulo.
No ano de 2009, após o desligamento do supervisor da área, Lucimar recebeu o convite de ser a responsável pelo Wrestling no COTP – modalidade que se divide entre a luta greco-romana e a olímpica.
Ao aceitar a proposta, começou a viver outro desafio em sua carreira: tornar-se a única mulher a treinar uma equipe greco-romana no país. Tudo isso porque, o estilo criado por franceses no século XIX, só aceita apenas homens como competidores.
Isto foi até motivo de “revolta”, olhares preconceituosos e comentários desnecessários no Pan-americano da Juventude, realizado no México, em 2010. Cumprindo seu papel de técnica da categoria cadete – 15 a 17 anos –, viu treinadores de outros países irem reclamar com o responsável pela delegação brasileiro no torneio. “Disseram que eu não deveria estar ali, porque era muito complexo para uma mulher. Tirei de letra, isso não me abalou”, conta.
Golpeando o preconceito
O enaltecimento do sexo masculino contra o sexo feminino não foi vivenciado apenas uma vez em sua vida. Desde que escolheu a luta como profissão, Lucimar sentiu na pele o preconceito se manifestar de diversas formas.
Sua habilidade foi questionada, pelo fato de não ser um homem, e até a sua opção sexual. Heterossexual, casada desde os 19, mãe de quatro filhos e de quatro netas, teve que provar muitas vezes o quanto era capaz.
Ser mulher, ser mãe, ser atleta
“Iniciei uma família com a mesma idade que me casei. Foi muito difícil conciliar, pois meu marido não queria que eu permanecesse no esporte. Mas, depois de algum tempo e dos meus resultados, recebi seu apoio”.
A maternidade, junto a rotina extensa de esposa e atleta, foi um dos grandes desafios. Treinava, trabalhava e precisava dividir o tempo para estar presente em casa, com seus familiares. “Foi muito duro, mas valeu a pena”, comenta.
Mesmo com todas as dificuldades encontradas em sua vida, foi coroada com medalhas e prêmios – como a sapatilha de ouro por ter sido a melhor atleta Sul-americana de Wrestling. “As pessoas acham que a gente não tem capacidade de fazer as coisas. Mas temos inteligência o suficiente para desenvolver um ótimo trabalho.”
As conquistas e o futuro
Há mais de 30 anos no esporte, segmento que considera ser responsável pela mudança de autoestima e disciplina no mundo, a técnica tem alguns anseios. Já viveu várias fases, mas, agora, deseja ver seus lutadores conquistarem uma medalha olímpica e, na vida pessoal, quer aposentar tranquilamente. Porém ainda não tem previsão de quando parar.
Em contrapartida, segue rua rotina de técnica e mulher. Vivenciando sempre estar junto ao “seio familiar”, como define, e de seus “pupilos”. Perguntada sobre suas maiores conquistas, Lucimar garante que é poder ver seus atletas tendo ascensão social. “Não só popularidade. Alguns foram até campeões pan-americanos. Mas a maior conquista é, mesmo sendo cansativo, com toda dificuldade, orientar esses atletas, ajudando que eles se tornem bons cidadãos”, finaliza.