Home Futebol PAPO TÁTICO: Pep Guardiola reinverte a pirâmide mais uma vez

PAPO TÁTICO: Pep Guardiola reinverte a pirâmide mais uma vez

Luiz Ferreira
Produtor executivo da equipe de esportes da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, jornalista e radialista formado pela ECO/UFRJ, operador de áudio, sonoplasta e grande amante de esportes, Rock and Roll e um belo papo de boteco.

Não estranhe o título deste post, caro leitor. O termo “invertendo a pirâmide” vem do livro “Inverting the Pyramid: The History of Football Tactics”, do jornalista inglês Jonathan Wilson, publicado no ano de 2008. A tal pirâmide vem do lendário desenho tático conhecido como 2-3-5, o chamado “sistema clássico”. Após mais de um século de futebol (e de muitas mudanças no posicionamento dos jogadores e na disposição tática das equipes pelo mundo a fora), Pep Guardiola resgatou esse esquema no último sábado, durante a vitória do Bayern de Munique sobre o Werden Bremen por cinco a zero, pelo Campeonato Alemão. A história é cíclica, meus amigos.

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Quem assistiu ao massacre do Mayer de Munique sobre o Werden Bremen, pela vigésima sexta rodada do Campeonato Alemão, percebeu que a equipe bávara tem uma obsessão bastante clara: atacar e fazer gols. O jogo vertical, a troca de passes em velocidade, a marcação por pressão em cima do adversário são algumas das muitas características do time comandado pelo espanhol Pep Guardiola, que não esconde a inspiração no Santos de Pelé e no Flamengo de Zico. Mesmo com desfalques por lesão e com a obrigação de poupar seus principais atletas para a sequência da Bundesliga e da Liga dos Campeões da Europa, o Bayern mantém a sua proposta sem se importar com quem está na sua frente.

No papel, o time entrou em campo armado num 4-1-4-1, com o espanhol Xabi Alonso organizando a saída de bola entre as duas linhas de quatro. No entanto, não demorou para que Ribéry, Coman, Müller, Thiago Alcântara e Götze se posicionassem como uma autêntica linha de atacantes à moda antiga, com dois pontas, dois meias armadores e um centroavante. Os olhos mais atentos perceberam nessa postura ofensiva da equipe bávara, o retorno do famoso 2-3-5, esquema tático criado ainda no século XIX na Inglaterra. O resultado da soma da proposta de jogo com o bom futebol dos bávaros foi mais uma surra no adversário.

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Time do Bayern de Munique que goleou o Werder Bremen pela Bundesliga. No papel, um 4-1-4-1. Na prática, o retorno do clássico 2-3-5.

Time do Bayern de Munique que goleou o Werder Bremen pela Bundesliga. No papel, um 4-1-4-1. Na prática, o retorno do clássico 2-3-5.

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Mas e a tal reinversão da pirâmide? Onde entra nessa história? Jonathan Wilson nos conta os primeiros registros da utilização do 2-3-5 vêm dos últimos anos da década de 1870. Em 30 de março de 1878, o Wreham Football Club teria conquistado a Copa de País de Gales jogando nesse esquema tático. Já o técnico e escritor húngaro Árpád Csanádi afirma em seu livro Soccer que o desenho da “pirâmide” foi utilizado pela primeira vez na Universidade de Cambridge, no ano de 1883. A partir das primeiras décadas do século XX, o 2-3-5 se disseminou em várias partes do mundo e logo se tornou o “esquema da moda” dos principais times de futebol da Europa e da América do Sul.

Durante a Copa do Mundo de 1930 (a primeira da história), a Seleção do Uruguai (já conhecida na época como a Celeste Olímpica) venceu a Argentina na final da competição por quatro a dois, em Montevidéu, numa bela execução do 2-3-5. O centroavante Pedro Cea se movimentava e abria espaços para a chegada de Hector “Manco” Castro, o autor do quarto gol uruguaio e um dos mais festejados ao final da partida. Mais atrás, José Leandro Andrade (um dos primeiros “bad boys” da história do futebol) comandava o meio-campo com muita maestria. O time comandado por Alberto Suppici usava e abusava da “pirâmide”.

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A Seleção do Uruguai conquistou a Copa do Mundo de 1930 jogado (e bem) no 2-3-5.

A Seleção do Uruguai conquistou a Copa do Mundo de 1930 jogado (e bem) no 2-3-5.

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Conforme os anos foram passando (e os desenhos táticos se modificando), a maneira de jogar futebol no mundo também sofreu alterações. As linhas defensivas foram ganhando três, quatro e até mesmo cinco jogadores. A postura ofensiva das equipes foi trocada pela cautela, pelo jogo físico e pelo congestionamento no meio-campo. De acordo com Jonathan Wilson, o ápice desse processo aconteceu durante a Copa do Mundo de 1990. Das vinte e quatro seleções que disputaram o Mundial na Itália, vinte jogavam com três zagueiros e cinco jogadores no meio-campo. Era a reinversão da pirâmide do 2-3-5.

Aquela Alemanha comandada por Franz Beckembauer tinha os seus méritos. Lothar Matthäus chegava à sua terceira Copa do Mundo no auge da carreira, Illgner fechava o gol e Klismann era a garantia de gols. No entanto, mesmo com tantos jogadores de qualidade, a equipe germânica jogava o futebol que marcou aquele mundial: muita marcação, muita força física e poucos gols. Não por acaso tantas partidas terem sido decididas nas cobranças de penalidades. Com seu 5-3-2, a Alemanha invertia a pirâmide clássica e conquistava a sua terceira Copa do Mundo.

A Alemanha inverteu a pirâmide e venceu a Copa do Mundo de 1990 no 5-3-2.

A Alemanha inverteu a pirâmide e venceu a Copa do Mundo de 1990 no 5-3-2.

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Como dissemos, a história é cíclica. Como diria Cazuza, “eu vejo o futuro repetir o passado”. E não demorou muito para que a tal “pirâmide” fosse invertida mais uma vez. No dia 8 de março de 2011, o Barcelona histórico de Messi, Xavi, Iniesta, Abidal e David Villa vencia o Arsenal da Inglaterra por três a um em Barcelona e revertia conquistada pelos Gunners no jogo disputado em Londres, abrindo caminho para a conquista da sua quarta Liga dos Campeões da Europa, imortalizando aquele Barça como um dos melhores times de todos os tempos. O técnico? Sim, ele de novo. Pep Guardiola.

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No papel, aquele Barcelona estava organizado no 4-3-3, com Messi saindo do comando do ataque e abrindo espaços para as investidas em diagonal de Pedro e David Villa. Conforme o Arsenal ia se encolhendo no seu campo e se defendendo como podia, o escrete catalão ia tomando conta do campo. Aos poucos, Xavi e Iniesta se juntaram ao trio ofensivo formando uma das maiores linhas de ataque que este que vos escreve já viu na vida (talvez inferior apenas ao time da era “MSN”). Os laterais Dani Alves e Adriano jogavam adiantados. A dupla de zaga improvisada também encurtava o espaço. Com a “reinversão” da pirâmide clássica, Guardiola formou um time que encantou o mundo.

O Barcelona reinverteu a pirâmide e encurralou o Arsenal na Liga dos Campeões da Europa de 2011.

O Barcelona reinverteu a pirâmide e encurralou o Arsenal na Liga dos Campeões da Europa de 2011.

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O clássico 2-3-5, desenho tático utilizado pela grande maioria das equipes de futebol no início do século XX, voltou com força através dos preceitos e da proposta de jogo de Pep Guardiola. O ímpeto ofensivo, a obsessão pelo ataque e pelos gols e a marcação sob pressão são apenas algumas das caraterísticas dos seus times. Tanto no histórico Barcelona do início da década de 2010 como no Bayern de Munique atualmente (mesmo sem ter conquistado títulos internacionais), o espanhol segue firme no resgate da “pirâmide” e na reutilização de conceitos vistos no Santos de Pelé e no Flamengo de Zico só para citar algumas das suas inspirações.

A história é cíclica. Assim como Guardiola, outros técnicos como os alemães Jürgen Klopp e Hupp Heynckes, o argentino Jorge Sampaoli, o italiano Carlo Ancelotti e o brasileiro Tite também buscam implementar esse estilo de jogo baseado na intensidade ofensiva e na ocupação dos espaços dentro das suas equipes. Tal como o 2-3-5 dos primeiros anos do futebol. Aos poucos, o ímpeto ofensivo e a busca pelo jogo bonito tem tomado conta das principais cabeças pensantes do nosso futebol.

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A pirâmide foi invertida mais uma vez. Será que voltamos aos velhos tempos? Tomara.

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