Antes de mais nada, é preciso lembrar mais uma vez que tudo aquilo que eu e você vimos nestas duas partidas do Flamengo no Mundial de Clubes nada mais é do que resultado das escolhas da diretoria rubro-negra. O planejamento foi muito mal feito e isso se reflete em campo, seja na preparação física dos atletas e na assimilação e execução dos conceitos de Vítor Pereira (que também tem sua parcela de culpa). A vitória por 4 a 2 sobre o Al Ahly só veio quando Abdelfattah levou um cartão vermelho discutível e na adoção de algo que este colunista prefere chamar de “modo pelada”. Muita desorganização, muita afobação e pouca pausa e toque de bola. Justamente os pontos fortes desse Flamengo.
Sem Gerson (suspenso), Léo Pereira e Filipe Luís (lesionados), Vítor Pereira apostou nas entradas de Vidal e Fabrício Bruno. Além disso, Matheuzinho deu lugar a Varela na lateral-direita. O 4-4-2 básico da equipe foi mantido com Arrascaeta e Everton Ribeiro se procurando mais no meio-campo, Gabigol mais móvel em relação a Pedro e muito apoio pelos lados do campo, mas ainda com distâncias muito grandes para serem percorridas pelos jogadores. Do outro lado, o Al Ahly do técnico Marcel Koller repetia o 4-4-1-1 da derrota para o Real Madrid, era muito mais organizado. Novamente, o Fla dava a impressão de estar sempre dois passos atrás do seu adversário no Estádio Ibn Batouta.
É verdade que Vítor Pereira teve pouco tempo para implementar seus conceitos na equipe e que ele enxerga o futebol de maneira bem diferente daquela que o time do Flamengo estava acostumada. Ao invés de aproximação e associações por dentro, um jogo mais posicional e baseado numa variação para o 3-2-5. Curiosamente, a jogada que terminou com a penalidade sofrida por Varela surgiu após bela troca de passes entre Arrascaeta e Gabigol por dentro (uma das especialidades do time). Foi a partir dessa combinação que surgiram alguns dos melhores momentos do Fla na partida deste sábado (11). Pedro arrastava a última linha para trás e Gabi se apresentava para a tabela no espaço aberto pelo camisa 9.
Apesar disso, o que prevalecia no Flamengo era mesmo o jogo mais posicional de Vítor Pereira. E com todas as distâncias enormes a serem cobertas, a defesa começou a sofrer com o vai e vem da bola ao ataque. Fabrício Bruno vacilou no gol de empate do Al Ahly, Thiago Maia cometeu penalidade tola no segundo tempo e todo o sistema defensivo ficou assistindo Abdelkader se livrar da marcação e acertar o canto direito de Santos (que já havia defendido a penalidade cobrada por Ali Maâloul). A essa altura, o escrete egípcio já usava bem o espaço que encontrava entrelinhas e aproveitava toda a afobação de Thiago Maia, Vidal e todo o sistema defensivo nos saltos para a pressão e nas coberturas.
Na prática, se um time ataca de maneira desorganizada, também vai defender desta mesma forma. E é isso que vimos no Flamengo contra o Al-Hilal e neste sábado (11) contra o Al Ahly. As distâncias enormes entre os jogadores rubro-negros só piorava a situação da equipe como um todo na transição defensiva e na contenção das investidas dos adversários. Lembrem-se de que os jogadores do Fla vinham acostumados a atrair o adversário e a atacar o espaço sem se preocupar em fixar ninguém no ataque (talvez em momentos específicos). Não foi por acaso que o escrete egípcio teve tanta facilidade para sair jogando com os zagueiros Yasser Ibrahim e Abdelmonem e com os volantes Fathi e Attia.
A grande verdade é que o Flamengo só conseguiu controlar mais o jogo quando o Al Ahly perdeu Abdelfattah na metade do segundo tempo. Mesmo assim, todo o time acabou entrando em algo que este que escreve chama de “modo pelada”. Muita afobação, muita ligação direta e pouca organização na hora de atacar. É verdade que o escrete rubro-negro se organizou com uma linha de cinco no ataque após a entrada de Everton Cebolinha, mas tudo era feito de maneira desorganizada. Thiago Maia se lançou ao ataque, Vidal virou zagueiro e a dupla Arrascaeta e Gabigol ficou perdida no meio do 4-3-2 do Al Ahly. Não foi por acaso que o time de Vítor Pereira (mesmo com um jogador a mais) sofreu com os contra-ataques do seu adversário em Tânger.
O Flamengo conseguiu a virada e a vitória em três gols “dados” pelo Al Ahly (uma vez com Gabigol e duas vezes com Pedro) e confirmou o terceiro lugar no Mundial de Clubes. O grande problema é que o time passa a impressão de ter “voltado algumas casas” com relação ao ano passado. Este que escreve entende bem que Vítor Pereira teve muito pouco tempo para implementar seus conceitos e que as condições físicas do elenco ainda são muito ruins. Mas não me parece ser a melhor escolha romper com um modelo de jogo de uma hora para outra. Ainda mais quando se sabe que esse mesmo time conquistou títulos importantíssimos no final do ano passado usando um jogo mais associativo do que posicional.
Pode ser que a solução seja uma adaptação por parte do treinador português no que se refere ao seu estilo de jogo ou até mesmo numa reformulação do elenco que não faria muito sentido diante do que se viu em 2022. Certo é que o Flamengo só superou o Al Ahly e ficou com o terceiro lugar no Mundial de Clubes por conta dos erros do seu adversário e da qualidade de Arrascaeta, Gabigol e Pedro. O grande problema está no “modo pelada” que tomou conta da equipe. E corrigir esses problemas é a grande missão de Vítor Pereira.