A Arábia Saudita entrou em campo com um plano. Isso era muito claro para este que escreve e todos aqueles que acordaram cedinho nessa terça-feira (22) para ver a estreia da Argentina de Lionel Messi (ainda uma das favoritas ao título da Copa do Mundo). Sim, o plano era altamente arriscado, mas era calculado e foi sim muito bem executado. E não demorou muito para que a equipe comandada pelo francês Hervé Renard conseguisse o impensável. Os “Falcões Verdes” impuseram seu ritmo, desgastaram a Albiceleste e conquistaram uma virada histórica no Estádio Lusail diante de um adversário poderosíssimo. Concentração e maturidade em nível máximo.
Na prática, a Arábia Saudita sabia de todos os riscos que estava correndo. A marcação mais alta e a linha de impedimento ajustada tinham o claro objetivo de deixar o forte ataque portenho sem condições de jogo e mostravam também o conhecimento de Herné Renard sobre o forte adversário desta terça-feira (22). O treinador da Arábia Saudita sabia que a Argentina tem predileção pela troca de passes por baixo com Messi ocupando a entrelinha e buscando Di María, Lautaro Martínez e Papu Gómez (substituto de Lo Celso, cortado da Copa do Mundo por lesão).
É por isso que a virada dos “Falcões Verdes” se torna ainda mais espetacular quando e analisada nesse ponto de vista. Quem pensaria que a Arábia Saudita fosse entrar em campo com linhas mais altas e impor um ritmo intenso na marcação. E assim como a vida, o futebol é feito de escolhas. Ao jogar assim, o técnico Herné Renard assumiu todos os riscos. E mesmo levando o gol logo cedo (numa penalidade bastante discutível), o escrete saudita se manteve fiel ao plano e esperou o momento certo de se impor na base da velocidade e da intensidade.
Ao mesmo tempo, era difícil não perceber que a Argentina parecia sentir o forte calor de Doha e os três gols anulados por impedimento. Isso porque Lautaro Martínez, Di María (que esteve muito abaixo do que pode produzir), De Paul e todo o sistema defensivo do time de Lionel Scaloni pareciam querer resolver o jogo rapidamente para “poupar fôlego” nos 45 minutos finais. E como eu e você sabemos, as coisas não são tão simples assim. Ainda mais por estarmos falando de um jogo de Copa do Mundo. Até mesmo Messi parecia mais nervoso e abatido em campo apesar de descolar bons passes em profundidade e ser o principal jogador da Argentina em campo.
E como era de se esperar, a Arábia Saudita iniciou o segundo tempo com tudo. Além da marcação alta, o time comandado por Herné Renard impôs um ritmo alucinante nas transições e na pressão pós-perda para pegar a defesa da Argentina desguarnecida. Exatamente como aconteceu no lance do gol de empate (marcado por Al-Shehri aos dois minutos da etapa final). Pressionar alto, retomar a posse e partir na direção da área adversária em altíssima velocidade. E vale destacar aqui a dificuldade de cobertura dos zagueiros Otamendi e Romero quando enfrentam adversários que atacam de maneira mais direta. E isso sem falar a partida mais abaixo de De Paul na criação.
Com o apoio constante do lateral Saud Abdulhamid (simplesmente um foguete nas ultrapassagens pelo lado direito) e a mesma força na marcação, a Arábia Saudita chegou ao gol da virada com o ótimo Salem Al-Dawsari colocando a bola no ângulo de Emiliano Martínez aos sete minutos do segundo tempo. Essa foi a senha para que Herné Renard recuasse o bloco de marcação e fizesse algumas alterações para proteger a entrada da sua área. A Argentina bem que tentou chegar com bolas levantadas na área (Messi e Tagliafico perderam boas chances), mas os “Falcões Verdes” conseguiram controlar o ritmo da partida e conquistar uma vitória espetacular em Doha.
Difícil não perceber o abatimento da Albiceleste contrastando com a alegria da Arábia Saudita após o apito final. O plano de Henré Renard poderia ter dado errado? Com certeza! Ainda mais diante dos três gols anulados por impedimentos milimétricos no primeiro tempo e do espaço que Messi encontrou no meio do 4-1-4-1/4-5-1 dos “Falcões Verdes”. Mesmo assim, este que escreve ficou com a impressão de que o grande erro da equipe comandada por Lionel Scaloni foi não ter compreendido o plano do seu adversário a tempo e não ter colocado um pouco de paciência para superar a forte marcação saudita no forte calor de Doha. Faltou essa percepção.
Já a Arábia Saudita entra para a história por conta do resultado desta terça-feira (22) e pela aplicação tática com que todos os jogadores executaram o plano de Henré Renard. Se dispor a correr riscos faz parte do futebol. Sempre fez, aliás. Essa é a grande lição que os “Falcões Verdes” deixam para todas as outras seleções que disputam essa Copa do Mundo. Perseverança, concentração e entrega sempre dão resultado.