Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa o jogaço desta terça-feira (26) e as ideias de Pep Guardiola e Carlo Ancelotti
Já disse e repito: o futebol é a maior invenção do homem depois da penicilina, do sorvete de flocos e do pão de queijo. O bom de amar esse esporte é que você acaba premiado com apresentações épicas e de encher os olhos como a que vimos nesta terça-feira (26). A vitória do Manchester City sobre o Real Madrid (no jogo de ida das semifinais da Liga dos Campeões da UEFA 2021/22) pode facilmente entrar no seleto grupo dos “maiores espetáculos da terra” e das “odes ao futebol bem jogado”. Eletrizante, épico, emocionante. Escolham o adjetivo que quiserem. As equipes de Pep Guardiola e Carlo Ancelotti nos provaram que, ao contrário do que alguns mais saudosistas dizem por aí, ainda existe muita beleza no futebol praticado atualmente. Gabriel Jesus, Fernandinho e Vinícius Júnior que o digam.
🆚| #CityReal 4-3
⚽️| De Bruyne, Gabriel Jesus, Foden e B. Silva
⚽️| Benzema (2x) e Vinícius Júnior
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📊 Estatísticas:📈 Posse: 60% – 40%
👟 Finalizações: 16 – 11
✅ Finalizações no gol: 6 – 5
🛠 Grandes chances: 6 – 2
☑️ Passes certos: 543 – 335💯 Notas SofaScore 👇 pic.twitter.com/yZjr2IAf4v
— Sofascore Brazil (@SofascoreBR) April 26, 2022
É lógico que as equipes dos anos 1970, 1980 e 1990 merecem toda a nossa reverência e reconhecimento. Todas elas deixaram legados inestimáveis e influenciam a mente daqueles que pensam o futebol até hoje. Vide o próprio Pep Guardiola. O técnico espanhol foi treinado por Johan Cruyff no histórico Barcelona conhecido como “Dream Team” e coloca em prática todo o conhecimento que adquiriu nesses tempos mais românticos que os nossos. E nesse ponto, a trajetória de Carlo Ancelotti também se destaca. O comandante italiano é conhecido pela liderança tranquila e também coloca nas suas equipes toda sua experiência como volante do poderoso Milan de Arrigo Sacchi, Gullit, Van Basten, Donadoni, Maldini, Rijkaard, Baresi e companhia.
O que vimos nesta terça-feira (26) no Etihad Stadium foi simplesmente mais uma prova de que o futebol jogado hoje tem sim muita qualidade! Duelos táticos, grandes treinadores na beira do gramado, lances de pura genialidade, intensidade em nível quase estratosférico, grandes defesas por parte dos dois goleiros e atuações históricas. E por mais que o Manchester City pintasse como o favorito no confronto das semifinais da Liga dos Campeões da UEFA, o Real Madrid trazia a sua camisa pesadíssima, o talento individual de Modric, Vinícius Júnior e Benzema e a certeza de que poucos sabem jogar essa competição como ele. Todos esses ingredientes transformaram esse jogo num verdadeiro duelo de titãs em Manchester. Sem exagero.
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O início da partida fala por si só. Carlo Ancelotti mandou o uruguaio Valverde para o jogo no lugar de Casemiro (lesionado) e apostou numa espécie de 5-4-1 sem a bola, com o camisa 15 fechando a última linha com Carvajal, Éder Militão, Alaba e Mendy. Mais à frente, Rodrygo, Modric, Kroos e Vinícius Júnior fechavam os lados e deixavam Benzema no comando de ataque. Só que o Manchester City entrou em campo com aquela ritmo que eu e você conhecemos e o padrão de jogo implementado por Pep Guardiola que eu e você conhecemos. Stones jogava como lateral pela direita, mas o 4-3-3 inicial se transformava num 2-3-5 conforme a movimentação dos jogadores de frente. O lance do primeiro gol dos Citzens mostra bem como a equipe de Pep Guardiola sabia manipular as defesas adversárias para abrir espaços e atacá-los.
É sempre bom destacar que Pep Guardiola usa demais a inversão para o 2-3-5 para ocupar espaços e criar superioridade numérica no campo ofensivo. É um padrão bem claro e uma das grandes característica de um dos maiores expoentes do “jogo de posição”. Foi através dessa manipulação dos espaços na última linha do Real Madrid que Gabriel Jesus recebeu de Kevin de Bruyne e fez o segundo do Manchester City (aos 10 minutos de partida) e que Mahrez e Foden desperdiçaram chances incríveis na frente de Courtois. E é aí que morava o perigo. O próprio Guardiola já havia falado do respeito que tinha pelo Real Madrid e pelo tamanho da equipe espanhola. O confronto desta terça-feira (26) pedia “erro zero” por parte dos Citzens.
Carlo Ancelotti sabe que tem à sua disposição um dos trios de atacantes mais fortes do planeta. E mesmo quando sua equipe não tinha espaço para circular a bola por dentro, o jeito era apelar para as bolas levantadas na área. Mendy recebe pela esquerda (com muita liberdade) e vê Rodrygo e Vinícius Júnior arrastando a defesa dos Citzens para trás. Benzema aparece no espaço entre Laporte e Zinchenko e só escora o cruzamento para as redes. Tudo dentro do 4-3-3 preferido de Ancelotti e num dos únicos momentos em que o Manchester City cochilou nesse primeiro tempo. Aliás, era algo esperado por parte de uma equipe do tamanho do Real Madrid. Intensidade, coragem, força ofensiva e a potencialização do talento individual.
Aos sete minutos de jogo, Fernandinho colocou a bola na cabeça de Foden e viu o camisa 47 marcar o terceiro gol do Manchester City. O recital de futebol desta terça-feira (26) ainda teria espaço para o “solo” de Vinícius Júnior em arrancada de gente grande após drible de corpo sensacional. O Real Madrid voltou para o jogo e Carlo Ancelotti fez o óbvio ao ver que sua equipe estava perdendo o meio-campo. Sacou um exausto Rodrygo e mandou o francês Camavinga para o jogo. Só que o City é o City. A equipe de Manchester não só executa os preceitos de Pep Guardiola quase que de memória como consegue encontrar espaços onde ninguém espera achar. Mesmo com seu adversário marcando num 5-2-3, Bernardo Silva aproveitou a “garoteada” da defesa merengue e acertou um belo chute de canhota. Parecia que a parada estava resolvida.
A partida desta terça-feira (26) não poderia terminar sem a cavadinha de Benzema e a certeza de que o confronto está muito aberto para o jogo de volta em Madrid. Desde mais uma apresentação quase perfeita do “jogo de posição” de Guardiola e passando pela firmeza do trabalho tático de Carlo Ancelotti, essa semifinal de Liga dos Campeões já entrou para a história. Pelos gols, pelas atuações brilhantes de jogadores como De Bruyne e Benzema, pelos lançamentos de Modric, pela polivalência de Vinícius Júnior, pela inteligência de Bernardo Silva e por todos os ingredientes que esse confronto entre Real Madrid e Manchester City deixou para nós, reles mortais apreciadores do futebol bem jogado. E o melhor de tudo, senhores, é a certeza de que muita coisa ainda está por vir nessa Champions League.
Isso porque Guardiola e Ancelotti ainda possuem suas cartas na manga e conhecimento suficiente para que o confronto de volta seja ainda mais emocionante do que esse desta terça-feira (26). Aliás, todos aqueles que amam o velho e rude esporte bretão devem agradecer aos deuses e deusas pelo simples fato de poder apreciar estes dois senhores na beira do gramado. E Manchester City e Real Madrid encarnaram o amor que esse negócio chamado futebol é capaz de despertar nas pessoas.