Na coluna PAPO TÁTICO, Luiz Ferreira analisa as escolhas de Pia Sundhage no primeiro dos dois jogos amistosos contra as Matildas
Não, a Seleção Feminina teve uma atuação muito ruim diante da sempre perigosa e competitiva Austrália de Sam Kerr, Alanna Kennedy e Mary Fowler neste sábado (23), no Commbank Stadium, em Sydney. A equipe comandada por Pia Sundhage abusou das falhas defensivas (justamente um dos pontos fortes da equipe), teve uma criatividade quase nula no meio-campo e agrediu muito pouco no ataque. Por outro lado, o contexto geral da primeira da série de duas partidas amistosas contra as Matildas ajuda a explicar por que a equipe brasileira esteve tão mal em campo. Este que escreve não está “passando pano” ou tentando “tapar o sol com a peneira” como alguns podem achar. Observar o cenário e cada situação de antes, durante e após a partida deste sábado (23) é salutar para o debate e pode nos auxiliar na compreensão de tudo aquilo que aconteceu com a Seleção Feminina durante os noventa e poucos minutos de partida. Incluindo algumas opções no mínimo questionáveis da treinadora sueca na escalação e nas substituições.
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Há muito tempo se fala na necessidade de renovação da equipe principal e do aproveitamento de jogadoras mais jovens. Só que Pia Sundhage meio que dava a impressão de ter “metido o louco” na escalação inicial da Seleção Feminina. Muitas substituições com relação aos últimos amistosos e um time completamente diferente daquele que eu e você estávamos esperando, com Ana Vitória e Andressa Alves na proteção da zaga, Ary Borges e Kerolin pelos lados e Ludmila e Gio formando a dupla de ataque no 4-4-2/4-2-4 costumeiro da treinadora sueca. Escolhas que se justificavam pela longa viagem até a Austrália, pela adaptação ao fuso horário local e pela necessidade de se evitar lesões. Mas o que se via na prática era uma Seleção Feminina muito frágil na saída de bola e com uma proteção extremamente frouxa na frente da última linha, visto que Andressa Alves se transformou em presa fácil para a marcação das Matildas por conta da falta de “cacoete” para exercer a função pedida pela treinadora sueca e por prender demais a bola numa zona perigosa do campo.
A Seleção Feminina conseguiu se segurar até os 36 minutos do primeiro tempo, quando Sam Kerr escorou bola levantada na área para Polkinghorne empurrar para as redes. Falha coletiva de uma equipe que ficava pouco com a bola e que “aceitava” a marcação adversária. Esse cenário fez com que Pia Sundhage fizesse quatro substituições após o intervalo. Adriana, Geyse, Tainara e Katrine entraram nos lugares de Gio, Ludmila, Érika e Tamires e a equipe ganhou um pouco mais de consistência. Logo no primeiro minuto da segunda etapa, Kerolin achou Adriana se lançando nas costas da zaga australiana, mas a camisa 11 desperdiçou ótima oportunidade. Aos 20 minutos (num momento em que Bruninha estava fora do campo recebendo atendimento médico), Van Egmond teve todo o tempo do mundo para colocar a bola na cabeça de Fowler. Mas as mexidas da treinadora sueca se mostrariam acertadas no lance seguinte, com Adriana forçando o erro na saída de bola, roubando a bola de Alanna Kennedy e chutou na saída da goleira Williams. Um dos melhores momentos do Brasil no jogo.
Mesmo assim, a Seleção Feminina seguia jogando muito abaixo do que pode e do que já jogou contra equipes até mais fortes e mais organizadas do que a Austrália. E o ponto aqui é notar que o contexto geral influenciava diretamente na atuação das comandadas de Pia Sundhage e nas próprias escolhas da treinadora sueca. Marta e Debinha entraram nos lugares de Kerolin e Ana Vitória, pontos que reforçam a tese de que nomes como Angelina e Duda não estavam em plenas condições de jogo. E com o meio-campo ainda mais frouxo na marcação (com Andressa Alves cada vez mais perdida num setor onde simplesmente não se encaixa e Adriana jogando mais pela direita), o escrete canarinho sofreu com a intensidade das suas adversárias. No contexto geral, Bruninha, Antônia e Ary Borges foram bem, mas acabaram sofrendo demais com a falta de combatividade no meio-campo e viram a Austrália construir a jogada que resultou no gol da volante Van Egmond, aos 34 minutos do segundo tempo. A desorganização e o cansaço da equipe de Pia Sundhage eram evidentes.
É possível sim criticar algumas das escolhas de Pia Sundhage. Mas fazer isso sem levar todo o contexto da partida deste sábado (23) em consideração é cair no “lugar comum” de alguns comentaristas que preferem analisar e criticar sem base e sem abrir mão de conceitos já surrados e batidos. Essa mesma Seleção Feminina (ainda que não tenha jogado tudo aquilo que pode e deve jogar) já havia mostrado evolução tática nas partidas contra a Argentina. E por mais que a Albiceleste esteja num nível bem inferior ao das Matildas, foi possível notar sim que Pia Sundhage estava buscando alternativas para seu 4-4-2/4-2-4 costumeiro com o posicionamento de Marta um pouco mais à frente do que nos Jogos Olímpicos. Podemos sim questionar a presença de Tamires na lateral-esquerda e a de Andressa Alves na frente da zaga quando haviam jogadoras no banco de reservas que poderiam ter ganhado pelo menos alguns minutos neste sábado (23). Principalmente Thaís e Júlia Bianchi. Mas não sabemos quais eram as suas condições físicas.
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Fato é que a adaptação (ou a falta dele) ao fuso horário e todo o desgaste da viagem até a Austrália influenciaram demais no desempenho da Seleção Feminina e em todas as escolhas (ainda que perfeitamente questionáveis) de Pia Sundhage. Por outro lado, a equipe brasileira foi bem quando conseguiu ocupar mais o campo de ataque, explorar o espaço entre Carpenter e Alanna Kennedy pelo lado esquerdo e pressionar a saída de bola das Matildas. No mais, apenas marcação (frouxa) e ligações diretas para as atacantes brigarem contra a zaga australiana. É possível que Duda, Angelina, Adriana, Marta e Debinha comecem a partida da próxima terça-feira (26) desde o inicio e que Pia Sundhage mande a campo a equipe que considere a ideal (para este momento) dependendo do cenário que terá pela frente. A atuação ruim também deixa lições importantes sobre determinadas escolhas que já se mostraram completamente desnecessárias. O posicionamento de Andressa Alves como volante e de Tamires na lateral são algumas delas.
Este que escreve gostaria de ver mais variações na movimentação do 4-4-2/4-2-4 costumeiro da treinadora sueca. Por mais que esse seja o desenho tático preferido da comandante da Seleção Feminina, é importante ter cartas na manga contra adversários mais fortes e mais consistentes. Ainda mais quando o contexto não é o mais favorável como aconteceu neste sábado (23), no Commbank Stadium, em Sydney. Esse é o momento certo de testar e de dar “casca” para as jogadoras mais jovens. Afinal, o trabalho de renovação da equipe de Pia Sundhage já está em curso.
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